Definição e importância do problema  

A diabetes mellitus (DM) engloba um grupo de afecções do metabolismo caracterizado pela presença de hiperglicémia resultante de defeitos da secreção e/ou da acção da insulina nos tecidos alvo com consequentes alterações do metabolismo dos hidratos de carbono, lípidos e proteínas. A longo prazo, a cronicidade da hiperglicémia complica-se com disfunção e falência de vários órgãos, em especial olhos, rins, nervos, coração e vasos. Trata-se da doença endocrino-metabólica mais comum da infância e adolescência, com consequências importantes no âmbito do desenvolvimento físico e emocional.

Distinguem-se vários tipos de diabetes mellitus, sendo mais frequentes as designadas de tipo 1 e tipo 2 abordadas respectivamente nas alíneas 1. e 2. deste capítulo. Na alínea 3. são analisadas as formas mais raras.

  • Diabetes mellitus tipo 1 (DM 1), anteriormente designada insulino-dependente, a mais frequente na criança, caracterizada por défice total e permanente de secreção de insulina por destruição auto-imune das células beta dos ilhéus de Langerhans pancreáticos em indivíduos geneticamente susceptíveis; as manifestações clínicas surgem quando já cerca de 90% das referidas células se encontram destruídas. Trata-se duma das doenças crónicas mais frequentes na criança (ligeiramente mais frequente que as neoplasias e quatro vezes mais frequente que a fibrose quística).
  • Diabetes mellitus tipo 2 (DM 2), anteriormente designada não insulino-dependente ou de início no adulto, caracterizada por resistência dos tecidos à acção da insulina (insulinorresistência) associada a graus variáveis de disfunção das células beta. Embora seja muito menos frequente que a DM 1, na idade pediátrica verifica-se incidência crescente relacionável com o aumento de prevalência da obesidade à qual está geralmente associada.

1. Diabetes mellitus tipo 1 (DM 1)

Aspectos epidemiológicos

A incidência da diabetes mellitus tipo 1 (DM1) até aos 15 anos de idade apresenta grande variabilidade entre áreas geográficas, e mesmo entre países (cerca de 50/100.000 na Finlândia e na Sardenha e de 20/100.000 nos restantes países da Europa.

Em Portugal, país que conta desde 2009 com um sistema de registo nacional de diabetes aplicado ao grupo etário 0-19 anos designado pelo acrónimo DOCE registou-se no ano de 2014 uma incidência no grupo etário dos 0-14 anos de 17,5/100.000 e no grupo etário dos 0-19 anos, 14,8/100.000.

De acordo com diversos estudos multicêntricos realizados na última década, existe uma franca tendência para o aumento da incidência (cerca de 90.000 novos casos por ano), mais acentuadamente no grupo etário abaixo dos 5 anos.

Classicamente descrevem-se dois picos de maior incidência de DM1 na criança: um entre os 5-7 anos, possivelmente relacionado com maior exposição a infecções víricas com a entrada para a escola; e um segundo pico na puberdade, possivelmente desencadeado pelas alterações hormonais que caracterizam esta fase de desenvolvimento.

O aumento de incidência no grupo dos 0-5 anos e o facto de neste período se verificar uma resposta autoimune mais agressiva levantam questões em relação à própria etiopatogénese da diabetes, admitindo-se a forte influência de factores ambientais.

Nesta perspectiva cabe salientar a realização dum estudo multicêntrico em curso a nível mundial – The Environment Determinants of Diabetes in the Young – (TEDDY) incidindo sobre cerca de 8.000 crianças identificadas como geneticamente susceptíveis para a DM1 que tem precisamente como um dos seus objectivos identificar possíveis determinantes ambientais, podendo exercer influência desde o período perinatal, o que tem implicações práticas na prevenção.

O diagnóstico em idades precoces coloca efectivamente desafios especiais no âmbito da organização dos serviços de saúde de modo a garantir cuidados de qualidade.

Etiopatogénese

A etiopatogénese da DM1 é multifactorial, sendo reconhecida a contribuição em grau variável, e ainda não completamente determinada, da susceptibilidade genética, e de factores ambientais e imunológicos.

Está comprovada a predisposição genética para a DM1 (por exemplo genes relacionados com susceptibilidade para DM1 no cromossoma 6 e no cromossoma 11), sendo de referir que o tipo de hereditariedade é complexo e provavelmente poligénico. A identificação de combinações específicas de alelos HLA –DR e DQ confere cerca de 50% do risco.

Como exemplo de haplótipo considerado de alto risco inclui-se genericamente o DR3/4-DQ2/8 e, dentro deste grupo, como exemplos de haplótipos específicos:
DRB1*0401-DQA1* 0301-DQB1*0302
DRB1*0401-DQA1* 0301-DQB1*0301

Citam-se como exemplos de outros haplótipos DR-DQ que, pelo contrário, conferem protecção:
DRB1*1501- DQA1*0102-DQB1*0602
DRB1*0701- DQA1*0201-DQB1*0303
DRB 1*1401- DQA1*0101-DQB1*0503

A ocorrência em familiares pode estar presente em cerca de 10% dos casos, não sendo, no entanto, possível estabelecer um padrão de transmissão hereditária.

Numa população geral com risco de DM1 de 0,5%, o risco num gémeo idêntico será de cerca de 36% e, num irmão, de 4-9%. O risco é cerca de 3 vezes maior quando é o pai (3,6-8,5%) a apresentar DM1 relativamente à mãe (1,3-3,6%).

O risco parece ser também maior quando o caso index é diagnosticado em idade mais jovem.

Alguns factores ambientais parecem estar implicados, tais como: alimentação com leite de vaca em natureza antes dos 2 anos de idade e infecções por vírus (rubéola, sarampo, coxsackie B, citomegalovírus, etc.).

Estes factores poderão actuar como desencadeantes do processo de destruição autoimune das células beta, mas também modificando a patogénese, actuando como agravantes (infecções perinatais, défice de vitamina D) ou como atenuantes (infecções durante o 1º ano de vida). Não está provada a relação entre vacinas antivíricas e DM1.

A DM1 é uma doença autoimune mediada por células T. Um processo inflamatório dos ilhéus ou “insulite”, com infiltração de macrófagos, células B e células T (CD8 +) precede o início dos sinais clínicos.

Reconhecem-se vários autoanticorpos e antigénios associados a DM1, os quais constituem marcadores serológicos da autoimunidade da célula beta:

  1. Anti-células beta dos ilhéus de Langerhans (ICA);
  2. Anti-descarboxilase do ácido glutâmico (GAD);
  3. Anti-insulina (IAA);
  4. Antigénio associado a insulinoma IA2, IA2 β;
  5. Antigénio transportador do zinco (ZnT8A). Em mais de 90% dos indivíduos recém-diagnosticados podem ser identificados um ou vários destes autoanticorpos.

A existência destes marcadores imunológicos, podendo ser detectados por vezes vários anos antes das manifestações clínicas, permite que nalguns indivíduos seja possível o diagnóstico na fase pré-clínica. Quanto maior a diversidade de anticorpos, maior o risco de progressão para DM1.

Num estudo recente englobando cerca de 600 crianças concluiu-se que nos casos com identificação de mais de dois autoanticorpos ocorreu progressão em 10 anos para DM1 em cerca de 70%, e em 15 anos para 84% em 15 anos.

Na história natural da DM1 podem descrever-se quatro fases:

  1. Fase pré-clínica de destruição autoimune com progressiva diminuição da secreção de insulina;
  2. Diabetes clínica;
  3. Fase de remissão transitória (“lua-de-mel”);
  4. Diabetes estabelecida com défice total e permanente de insulina associado a complicações agudas e crónicas.

A fase pré-clínica tende a ser de menor duração nas crianças mais jovens.

Estão em curso estudos prospectivos em parentes próximos de doentes com DM1 com autoanticorpos e genótipos no sistema HLA considerados predisponentes. O objectivo destes estudos é conceber o modo de prevenir ou atrasar o início das manifestações clínicas da doença.

A presença de anticorpos contra certos órgãos pode associar-se a DM1; os exemplos mais frequentes são:

  • Os anticorpos antitiroideia relacionados com a tiroidite autoimune;
  • Os anticorpos antitransglutaminase relacionados com a doença celíaca; e
  • Os anticorpos anti-suprarrenal (anti-CYP17 e CYP21A2) relacionados com a doença de Addison.

Critérios de diagnóstico

O diagnóstico de diabetes mellitus pode ser estabelecido de acordo com critérios baseados em valores no plasma:

  • Na glicose plasmática em jejum (pelos menos de 8 horas) ” = ou > 126 mg/dL; ou
  • Na glicose plasmática 2 horas após administração de glucose oral – prova de tolerância à glicose oral (PTGO) ” = ou > 200 mg/dL; ou
  • Na glicose plasmática determinada casual ou aleatoriamente (independentemente do tempo decorrido desde a última refeição) associada a quadro clínico sugestivo de diabetes (poliúria, polidipsia, perda de peso inexplicada, glicosúria e cetonúria); ou
  • No valor de hemoglobina glicada (HbA1c) = ou > 6,5% (a confirmar no pressuposto de repetição se na ausência de hiperglicémia inequívoca).

O diagnóstico de anomalia da glicémia em jejum/AGJ baseia-se no seguinte critério:

  • Glicose plasmática em jejum de 100-125 mg/dL (5,6-6,9 mmol/L).

O diagnóstico de tolerância diminuída à glucose/TDG baseia-se no seguinte critério:

  • Glicose plasmática 2 horas após administração de glucose oral – prova de tolerância à glicose oral (PTGO) ” 140 mg/dL – 199 mg/dL (7,8-11,1 mmol/L). (PTGO a realizar de acordo com as normas da OMS: – glicose anidra dissolvida em água na dose de 1,75 g/Kg de peso corporal; máximo = 75 g).

Assim, a realização de PTGO só está indicada para estabelecer, em casos assintomáticos, o diagnóstico de pré-diabetes (hiperglicémia intermédia) que inclui anomalia da glicémia de jejum (AGJ) e tolerância diminuída à glicose (TDG) representando um estádio intermédio entre a homeostase normal da glucose e a diabetes.

Notas importantes:
Hemoglobina glicada (HbA1c)

Não se valoriza como diagnóstico na presença de sintomas; no entanto a sua determinação inicial pode permitir ter uma noção sobre o tempo decorrido até à fase de apresentação aguda.
Este parâmetro reflecte o valor médio da glicémia nos 3 meses anteriores tendo em conta a vida média dos eritrócitos e o fenómeno de transferência da glucose para o eritrócito em função dos níveis glicémicos. Nalguns casos de hemoglobinopatias, e dependendo também dos métodos de determinação utilizados, não poderá ser valorizada.
Pode estabelecer-se a seguinte relação da HbA1c com valores de glicémia média:

  • > 10%: glicémia anterior média > 240 mg/dL;
  • 8-10%: glicémia anterior média 180-240 mg/dL;
  • 6-8%: glicémia anterior média 120-180 mg/dL.

Salienta-se, no entanto, que existem dificuldades com a padronização e a variação individual na relação entre HbA1c e glicémia, o que limita a conveniência deste exame laboratorial.

Marcadores de autoimunidade

Na avaliação inicial podem ser utilizados marcadores da autoimunidade da DM1:

→ anticorpos anti-célula beta e anti-insulina: GAD (GAD65), tirosino fosfatase IA
 2 e IA2 β e ZnT8.

  • Tipagem HLA
    Podem ser determinados os haplótipos de risco anteriormente descritos.
  • Péptido C
    A determinação do péptido C, a realizar apenas em centros especializados, poderá estar indicada perante situações duvidosas de classificação definitiva do tipo de diabetes com a seguinte fundamentação:
    → a biossíntese do polipéptido insulina (a partir das células beta dos ilhéus de Langerhans), ocorre com a libertação na corrente sanguínea de quantidades equimolares de insulina e de péptido C.
    O péptido C constitui um bom marcador da função das células beta e, por isso, da reserva e da produção endógena de insulina. Tem uma vida média cinco a dez vezes superior à da insulina endógena e a grande vantagem de não ser influenciado pela administração exógena de insulina, nem pela existência de anticorpos anti-insulina.

Na DM1 estabelecida os seus valores são baixos (< 0,6 ng/mL), não aumentando após refeição ou administração de glucose, contudo, em fases iniciais pode evidenciar valores dentro dos limites da normalidade.

Manifestações clínicas, laboratoriais e relação com a fisiopatologia

O modo de apresentação clínica clássica da DM1 – em regra de modo súbito e inesperado – é constituído por poliúria, polidipsia, polifagia e perda de peso.

A manifestação inicial resultante do défice de insulina é a hiperglicémia pós-prandial; à medida que o referido défice se vai acentuando, surgem sucessivamente as fases de hiperglicémia em jejum e, finalmente, hiperglicémia mantida e formação de corpos cetónicos (beta-hidroxibutirato, acetoacetato e acetona) revelando um défice grave de insulina associado ao aumento de hormonas contrarreguladoras, em particular glucagom. A hiperglicémia e a cetogénese resultam da não supressão, quer da glicogenólise, quer da neoglucogénese e da oxidação de ácidos gordos quando o défice de insulina se agrava.

Consequentemente, os depósitos de proteínas no músculo, e de lípidos no tecido adiposo, são metabolizados como substractos para a neoglucogénese e oxidação de ácidos gordos.

Se a glicémia ultrapassar o valor de 180 mg/dL, que corresponde ao limiar de reabsorção tubular renal da glucose, verifica-se glicosúria que, por sua vez, origina diurese osmótica a qual pode levar a desidratação; refira-se que a perda renal de água “arrasta” electrólitos tais como sódio e potássio. Para compensar as perdas de líquidos em excesso por via urinária, verifica-se polidipsia.

O estado catabólico conduz a perda de peso face à perda calórica relacionada com a glicosúria e cetose.

A cetoacidose diabética (abordada no capítulo seguinte), apesar de precedida por sintomas de hiperglicémia nas 2-3 semanas anteriores, surge como reveladora de DM1 numa proporção ainda importante de casos, a qual pode ser minorada com a valorização dos sintomas de hiperglicémia, a confirmação imediata do diagnóstico e o início precoce de tratamento com insulina.

A poliúria pode ser difícil de detectar no lactente; o reaparecimento de enurese nocturna constitui importante pista diagnóstica e, como tal, deve ser sempre valorizado.

Na criança pequena poderá não ser fácil distinguir entre polidipsia e “hábito de pedir água”, sobretudo na fase de aprendizagem da utilização do copo.

Dada a irregularidade do comportamento da alimentação na criança pequena, a polifagia dificilmente poderá ser valorizada pelos pais.

Importa, por isso, na presença de clínica sugestiva, estar alertado para o diagnóstico e confirmá-lo de imediato. Saliente-se que atrasar desnecessariamente o diagnóstico e, por isso, o início do tratamento, agrava o risco de cetoacidose, situação grave com risco de mortalidade. A presença de hiperglicémia e de cetonémia podem ser imediatamente documentadas com tiras reagente, actualmente já disponíveis em muitos centros.

Comorbilidade

Em consonância com a etiopatogénese da DM1, podem surgir concomitantemente doenças por autoanticorpos, designadamente tiroidite autoimune e doença celíaca (mais frequentemente), assim como outras: doença de Addison, hepatite autoimune, gastrite autoimune, dermatomiosite e miastenia grave. Dando ênfase às mais frequentes, cumpre pormenorizar:

  • A tiroidite autoimune ocorre em 17 a 30% dos casos de DM1. Na fase inicial da DM1, a função tiroideia pode estar alterada devido à hiperglicémia e perda ponderal; pode também verificar-se a existência de anticorpos antitiroideus em 25% dos casos; o hipotiroidismo subclínico pode aumentar o risco de hipoglicémia e o hipertiroidismo pode determinar mau controlo glicémico;
  • A doença celíaca ocorre em 1,6-16,4% dos casos de DM 1; o rastreio sistemático permite detectar a maioria dos casos nos primeiros 5 anos de evolução da doença; em tal circunstância, para além dos sintomas intestinais, a oscilação glicémica e as necessidades de insulina inferiores ao esperado podem alertar para o diagnóstico.

Tratamento

Objectivos

O principal objectivo do tratamento da DM1 na criança consiste em conciliar a prevenção de complicações com a promoção de um crescimento e desenvolvimento psicoafectivo normais, compatíveis com um estilo de vida tanto quanto possível igual ao das outras crianças.

Vários factores contribuem para dificultar a obtenção de um bom controlo metabólico durante a infância, nomeadamente:

  • A influência de alterações hormonais e psicossociais inerentes ao processo de crescimento e desenvolvimento;
  • Padrão irregular da alimentação, do exercício e das actividades escolares;
  • A tendência para infecções frequentes; e ainda
  • A falta de auto-suficiência da criança para o seu tratamento.

Assim, a definição de objectivos de controlo metabólico, para ser realista, deve ser ajustada a cada grupo etário e à realidade de cada caso, o que implica atender a um conjunto de particularidades, a saber:

  • A hipoglicémia tem maior risco de lesão do cérebro em fase de desenvolvimento neuronal;
  • Além das possíveis alterações neurocognitivas atribuídas à hipoglicémia, são reconhecidas, também, repercussões da hiperglicémia, da oscilação entre valores extremos de glicémia e da cetoacidose.

Daí a importância da precocidade da intervenção e da qualidade dos cuidados a prestar ao paciente com diabetes mellitus.

Nesta perspectiva, organismos internacionais prestigiados devotados à diabetes na idade pediátrica (ISPAD, ADA) recomendam os seguintes valores laboratoriais como objectivos de controlo:

” HbA1c: < 7,5%; ” glicémia pré-prandial: 90-130 mg/dL (5,0-7,2 mmol/L); ” glicémia ao deitar/nocturna: 90-150 mg/dL (5,0-8,3 mmol/L).

Insulinoterapia

Actualmente considera-se que o regime de insulinoterapia intensivo é o ideal para o tratamento das crianças com diabetes. O objectivo é simular o mais fielmente possível as variações normais nos níveis plasmáticos de insulina que se produzem nas crianças e jovens não diabéticos, suprindo as necessidades basais ao longo das 24 horas, e as adicionais compensatórias da hiperglicémia prandial.

Em nenhum regime consegue atingir plenamente este objectivo. Contudo, a disponibilidade de insulinas permitindo perfis laboratoriais cada vez mais próximos dos fisiológicos, de sistemas de perfusão subcutânea contínua de insulina permitindo simultaneamente a monitorização da glicémia, assim como o regime de injecções múltiplas, têm contribuído para uma aproximação do referido objectivo. (ver adiante – Tipos de Insulina)

1. Doses

A insulinoterapia deve ser instituída imediatamente após o diagnóstico. Em presença de cetose, o início do tratamento nas primeiras 6 horas pode prevenir a evolução para um quadro de cetoacidose.

Neste último caso, o tratamento deverá ser iniciado em internamento segundo um protocolo específico de insulinoterapia em perfusão endovenosa, hidratação e reposição electrolítica.

Se na data do diagnóstico não se verificar ainda franca descompensação metabólica, sem significativa hiperglicémia, desidratação ou cetose, pode iniciar-se a administração de insulina por via subcutânea, idealmente em regime de múltiplas injecções.

A dose total inicial de insulina depende da idade, do peso corporal, do estádio pubertário e do quadro de apresentação.

Quando o diagnóstico é feito numa fase precoce, sem significativa descompensação metabólica, a dose inicial é 0,3-0,5 Unidades/kg de peso corporal.

Nos casos de cetose, sem acidose e sem desidratação, em geral, a dose inicial será de 0,5-1 Unidade/kg/dia.

Após recuperação de um quadro de cetoacidose, as necessidades diárias de insulina são maiores: 0,6-0,8 Unidade/kg/dia nas crianças pré-púberes, e de 0,8-1,0 Unidade/kg/dia nos adolescentes.

Na data do diagnóstico, a maioria das crianças apresenta ainda alguma secreção residual de insulina, podendo após alguns dias ou semanas, entrar num período de remissão (“lua-de-mel”) durante o qual é possível obter glicémias normais ou quase normais com pequenas doses de insulina (menos de 0,5 Unidade/kg/dia).

Após este período, as necessidades tendem a aumentar:

  • Na pré-puberdade: 0,7-1,0 Unidade/kg/dia;
  • Durante a puberdade: 1-1,5 Unidades/kg/dia; por vezes: 2 Unidades/kg/dia.
2. Regimes de insulinoterapia

Os regimes de insulina são classicamente classificados em dois grupos de acordo com o número diário de injecções: – convencional quando se aplicam < 4/dia; e – intensivo ou basal – bolus quando 4 ou > /dia.

2.1 – Regime convencional

Deve ficar reservado para situações em que barreiras à adesão terapêutica, socioeconómicas ou outras não permitam um regime intensivo.

Sendo objectivo da insulinoterapia suprir as necessidades basais ao longo das 24 horas e as adicionais para compensar a hiperglicémia prandial, os regimes convencionais fora do período de remissão não conseguem aproximar-se deste objectivo sem incorrer num maior risco de hipoglicémia, sobretudo nocturna.

As doses de insulina nestes regimes, fixas ou minimamente ajustadas às variações diárias, condicionam o horário e o teor em hidratos de carbono das refeições.

2.2 – Regime intensivo ou basal-bolus

Pode ser administrado através de múltiplas injecções diárias (MID) ou de sistema perfusão subcutânea contínua de insulina (PSCI) vulgarmente designada por “bomba de insulina”.

MID →
Considerando a dose diária total, 40-60% deverá ser de insulina basal (ver adiante – tipos de insulina), sendo a restante de insulina rápida a administrar pontualmente (bolus) às refeições, de acordo com a glicémia pré-prandial e a quantidade de hidratos de carbono a ingerir.
Para o cálculo inicial da dose de cada bolus podem ser utilizadas fórmulas baseadas na dose total diária de insulina. (Quadro 1)
Ao número de Unidades necessário para a quantidade de hidratos de carbono calculada em gramas (bolus de alimentação), deve adicionar-se o bolus de correcção, ou seja, número de Unidades necessárias para fazer baixar a glicémia medida até à glicémia definida como alvo (em geral 100, 120 ou 140 mg/dL).

QUADRO 1 – Fórmulas para cálculo de bolus

Bolus de alimentação

Quantidade de insulina necessária para os hidratos de carbono
500/Dose Diária Total = Gramas de Hidratos de Carbono que 1 Unidade de Insulina é Capaz de Metabolizar (Relação Insulina/HC)

Bolus de correcção:

Glicémia Medida – Glicémia Desejada (Alvo)
Factor de Sensibilidade à Insulina (FSI)*

*Cálculo do FSI
1800/Dose Diária Total = Glicémia em mg/dL que 1 Unidade de Insulina é Capaz de Baixar (Factor de Sensibilidade à Insulina)

Bolus da refeição = bolus de alimentação + bolus de correcção

Posteriores ajustes irão sendo feitos de acordo com o perfil glicémico diário resultante das determinações de glicémias em jejum, pré- e pós-prandiais e nocturnas ou de valores obtidos através de sistemas de monitorização contínua de glicose.

O bolus de correcção pode ser também utilizado para corrigir hiperglicémia fora do horário de refeições. Deve ter-se em atenção que a descida da glicémia não deve exceder 100 mg/dL/hora.

PSCI →

A administração de insulina através de sistemas de perfusão subcutânea contínua constitui o método que mais se aproxima do perfil fisiológico.

Baseia-se no conceito basal-bolus com semelhante cálculo de percentagem basal e em algoritmos baseados na relação insulina/hidratos de carbono e sensibilidade à insulina.

Os PSCI utilizam apenas insulina de acção rápida que é debitada continuamente a um ritmo programável em função do perfil glicémico previsto durante as 24 horas. A este ritmo basal sobrepõem-se libertações pontuais (bolus) para as refeições ou para correcção de hiperglicémia, em função dos dados obtidos pelo dispositivo (calculador de bolus) de acordo com os algoritmos programados.

Tais sistemas oferecem vantagens únicas:

  • Permitindo atingir melhor controlo com menor risco de hipoglicémias:
  • A possibilidade de administração de doses tão pequenas como 0,01 Unidades torna este método o mais adequado para a idade pediátrica (em Portugal são disponibilizados pelo SNS dispositivos para todas as crianças cujo diagnóstico ocorra antes dos 6 anos);
  • Permitindo ajustar o ritmo basal de acordo com o perfil nocturno de cada criança evitando hipo e hiperglicémia nocturnas;
  • Em relação aos bolus permitem seleccionar perfil de libertação do bolus prandial de acordo com o teor da refeição e o previsto tempo de absorção dos diferentes tipos de alimentos (bolus quadrado, ou bifásico).

Como desvantagem:

  • Podendo aumentar o risco de cetoacidose em caso de interrupção por não haver insulina basal “em depósito subcutâneo”, requer monitorização atenta e conhecimento de normas de actuação imediata em caso de falência do sistema.

Dispositivos mais recentes associam os sistemas integrados de monitorização contínua de glicose (MCG) em tempo real e de PSCI, sendo o mais evoluído um sistema preditivo com algoritmo integrado na própria bomba de insulina: em tal modalidade, a administração de insulina é automaticamente suspensa cerca de 30 minutos antes da ocorrência de hipoglicémia, sendo retomada apenas quando a glicémia atinge níveis seguros.

A tecnologia está a evoluir para sistemas de ansa fechada “padrão de ourocapazes de automaticamente libertar insulina (ou insulina/glucagon) em resposta aos valores verificados ou previstos de glicémia através de sensor de glicose com transmissão de dados à “bomba”; trata-se, pois de um sistema de pâncreas artificial.

Como nota importante importa referir que os sistemas actualmente utilizados não dispensam a intervenção activa e a decisão do clínico e utilizador, o que implica levar a cabo programas de educação estruturados dirigidos ao paciente e família com o apoio intensivo da equipa de saúde.

3. Tipos de insulina

Actualmente em Portugal todas as insulinas comercializadas são obtidas por técnica recombinante, apresentando a mais baixa antigenicidade, o que as torna mais apropriadas para crianças. Utilizam-se, de modo geral, insulinas de acção intermédia e rápida, e associações de ambas por via subcutânea.

Os análogos de acção ultra-rápida podem ser utilizados para evitar hiperglicémia pós-prandial; o seu início de acção mais rápida e a mais curta duração permitem que possam ser administrados no meio da refeição em vez de antes da mesma.

A insulina glargina é um análogo com a particularidade de não apresentar picos, podendo a sua acção prolongar-se por mais de 24 horas, mantendo um nível basal de insulina.

O Quadro 2 e a Figura 1 resumem o perfil de algumas insulinas habitualmente usadas.

As pré-misturas têm a vantagem da possibilidade de administração em “caneta-seringa”.

QUADRO 2 – Tipos de insulina

*1 – Lilly; 2 – Novo Nordisk; 3 – Sanofi (#) NPH = neutra protamina de Hagedorn, insulina de acção intermédia
 Tipos de insulinaLaboratórios*Indicações
BasalHumana
Acção intermédia
1 – Humulin NPH®
2 – Insulatard®
3 – Insuman® Basal
Utilizada nos regimes convencionais associada a insulina de acção curta, pode também ser utilizada como basal ao deitar, nos regimes basal bolus.
Maior variabilidade intra e interindividual e maior risco de hipoglicémia nocturna.
BasalAnálogo
de acção lenta ou prolongada
2 – Levemir®
Insulina detemir
3 – Lantus®
Insulina glargina
Dois análogos basais disponíveis sem diferenças significativas e efeito mais previsível e reprodutível e de menor variação dia-a-dia do que a insulina NPH.
A glargina não está formalmente indicada abaixo dos 2 anos de idade, administra-se uma vez por dia, sempre à mesma hora, mantendo-se o efeito 24 horas.
A detemir pode usar-se após o 1 ano de idade: podem ser necessárias doses maiores e em 2 injecções diárias. Efeito de redução ou de menor ganho ponderal.
BolusHumana
de acção curta
1 – Humulin® Regular
2 – Insulina Actrapid®
3 – Insuman® Rapid
Pode ser utilizada em regimes de 2 injecções diárias com insulina intermédia ou como bolus prandial em regimes basal-bolus utilizando como basal insulina intermédia ou análogo de açcão longa: dado o perfil de acção devem ser administradas 30 minutos antes da refeição.
BolusAnálogo
Acção ultra-rápida
1 – Humalog®
Insulina lispro
2 – Novorapid®
Insulina aspártico
3 – Apidra®
Insulina glulisina
Os três análogos têm perfis equivalentes.
Início de acção mais rápida e duração mais curta que as insulinas de acção curta. Melhor controlo da hiperglicémia prandial (menor risco de hiperglicémia inicial e de hipoglicémia tardia). Maior eficácia na correcção de hiperglicémia.
Administram-se 5-15 minutos antes da refeição (dependendo da glicémia pré-prandial).
Como excepção, em crianças pequenas, com apetite irregular ou doença, podem ser administradas imediatamente após a refeição.
Usam-se nos regimes basal-bolus (com análogos de acção lenta) e em perfusão contínua de insulina.
Pré-misturas Análogos
bifásicos
1 – Humalog® Mix 25 e Humalog® Mix 50 Humulin® M3
2 – Novomix® 30 e Mixtard® 30
3 – Insuman Comb 25
Em geral, não indicadas na idade pediátrica.
Misturas, em proporção fixa, de insulina basal e rápida.
As insulinas bifásicas combinam uma percentagem de análogo de acção rápida com análogo de acção rápida ligado a NPH. Podem ser administradas às 3 refeições principais, com NPH ao deitar. Podem ser úteis em adolescentes com má adesão a um regime basal-bolus, mas em regra com pior controlo metabólico, maior risco de hipoglicémia e sem possível flexibilidade de horário e de teor das refeições.(#)

FIGURA 1. Esquema insulinoterapia basal-bolus

Autovigilância e monitorização

Determinação da glicémia

Com o moderno equipamento portátil e prático e os métodos actualmente disponíveis, a autovigilância da glicémia tornou-se parte indispensável da rotina diária do tratamento.

A frequência da sua determinação traduz-se em qualidade do controlo metabólico. Deve ser adaptada à idade da criança, à motivação e capacidades da criança e família, bem como às condições especiais durante a evolução da diabetes.

Todos os dados relacionados com a autovigilância devem ser registados, sabendo-se que os adolescentes mostram resistência em manter registos detalhados em papel.

Actualmente estão disponíveis glucómetros que permitem a introdução, o registo e “descarga” dos dados para o computador ou telemóvel, o que facilita a respectiva análise.

Existem também glucómetros com calculador de bolus que propicia o aconselhamento de acordo com os algoritmos inseridos.

Após estabilização metabólica relativa, na maioria dos casos podem ser realizadas em média seis determinações diárias da glicémia, excepto durante doença intercorrente, ou sempre que seja necessária maior informação do perfil glicémico para ajuste terapêutico.

A determinação da glicémia nocturna é também necessária.

A análise dos resultados, tendo como objectivo tirar o máximo proveito do controlo, deve ser feita em consultas periódicas, pelo menos 4 vezes por ano, ou sempre que se proceda a qualquer revisão do esquema de tratamento.

A determinação da hemoglobina glicada (HbA1c) deve ser efectuada, no mínimo, quatro vezes por ano.

Monitorização contínua da glicose

Existem atualmente dispositivos minimamente invasivos que permitem a determinação contínua da glicose (MCG), isto é, a medição do teor da glicose no líquido intersticial durante as 24 horas através de um sensor enzimático de glicose inserido no tecido subcutâneo.

Alguns destes sistemas emitem um alarme para hipoglicémia ou quando a glicémia atinge valores abaixo de um valor pré-estabelecido de glicose, ou ainda quando se verifica uma queda rápida deste valor.

Esta monitorização permite de modo retrospectivo:

  • identificar períodos de tempo com tendência para hiperglicémia, ou períodos de maior risco de hipoglicémia; e
  • compreender o efeito das doses de insulina, da alimentação e do exercício físico.

O acesso ao valor de glicose em tempo real permite ainda correcções imediatas melhorando assim muito significativamente o controlo glicémico. Todavia, a utilização individual destes sistemas tem ainda algumas limitações de carácter económico e de adesão.

Muito recentemente foi introduzido no mercado um sistema mais acessível de monitorização de glicose fornecendo informação da glicémia em tempo real e das 8 horas anteriores. Apesar de não se tratar de monitorização contínua, permite, no entanto, reduzir ao mínimo a necessidade de punção capilar.

Determinação da cetonémia

É essencial a determinação de cetonémia quando a glicémia é elevada (> 250 mg/dL), designadamente:

  • quando surgem intercorrências infecciosas; e
  • no contexto de utilização de bombas de perfusão subcutânea de insulina em que qualquer interrupção acidental de débito poderá levar rapidamente a défice de insulina por ausência de insulina de efeito basal em acção.

As tiras reagentes determinam os níveis de beta-hidroxibutirato, que é o primeiro corpo cetónico a ser sintetizado em caso de cetose e também o primeiro a desaparecer de circulação com o início da correcção.

  • Níveis até 0,5 mm/L são considerados normais; superiores a este valor necessitam de medidas de correção.
  • Níveis > 1,5 mm/L correspondem já a um risco elevado de cetoacidose e acima de 3 mmol/l acompanham-se geralmente de acidose.

Regime alimentar

Preconiza-se actualmente que a alimentação da criança com diabetes se baseie nos princípios de alimentação saudável recomendados para todas as crianças com um suprimento energético e de nutrientes semelhante ao das outras crianças da mesma idade, adequado ao crescimento, actividade física e prevenção de excesso ponderal.

O próprio termo “dieta” e a ideia de restrições devem ser banidos sobretudo entre os profissionais de saúde.

Está provado que a aplicação dum plano alimentar individualizado com ajustes adequados de insulina pode melhorar o controlo metabólico. Nesta perspectiva, é desejável que o plano alimentar de cada criança seja elaborado por nutricionista da equipa assistencial e regularmente adaptado e actualizado de acordo com as fases de crescimento e as circunstâncias do quotidiano.

As necessidades calóricas diárias podem estimar-se de acordo com a idade como para qualquer criança. De acordo com recomendações internacionais aceita-se como norma geral que 50-55% do suprimento calórico diário seja feito através de hidratos de carbono, 15 a 20% de proteínas, e < 35% de gorduras (e < 10% de gorduras saturadas e ácidos gordos trans) (Quadro 3).

QUADRO 3 – Regime alimentar*

*De acordo com as normas da ISPAD (International Society for Pediatric and Adolescent Diabetes), 2014
    • Suprimento energético para garantir crescimento e desenvolvimento óptimos, mantendo peso ideal, prevenindo a obesidade e as complicações agudas e crónicas.
    • Distribuição diária dos nutrientes em % do valor calórico total (VCT)
      • Hidratos de carbono (HC): 50-55%
         Maior consumo de HC complexos, com alto teor em fibras; consumo de sacarose < 10%
      • Gorduras: 25-35%
         < 10% gordura saturada + ácidos gordos trans
        < 10% gordura polinsaturada
        > 10% gordura monoinsaturada (até 20% do valor calórico total)
      • Proteínas: 15-20%

O consumo de fibras deve ser estimulado na criança acima dos 2 anos de idade, porém de forma gradual e cautelosa de modo a evitar distensão abdominal e cólicas.

Os frutos frescos, tal como os vegetais, devem fazer parte da alimentação diária da criança e jovem, suprindo as necessidades em fibras e vitamina C. Não está provada a necessidade de suplementação em vitaminas ou minerais em crianças com diabetes sem outras condições associadas. Em relação à vitamina D, em situação de insuficiência do metabólito monohidroxilado – 25, OH vitamina D3 -, deve proceder-se a suplemento de acordo com as recomendações para a população em geral. (ver capítulo sobre carências vitamínicas e minerais).

No que respeita ao consumo de gorduras, as gorduras saturadas e os ácidos gordos trans, principal determinante dos níveis de colesterol-LDL, não devem exceder 10% do suprimento energético total.

Quanto ao suprimento proteico, é necessário ter em conta que as respectivas necessidades diárias variam de acordo com o grupo etário; são maiores na primeira infância (1-2 g/kg/dia diminuindo progressivamente até 1 g/kg/dia aos 10 anos e 0,8-0,9 g/Kg/dia no final da adolescência).

A contabilização dos hidratos de carbono para o cálculo das doses de insulina nos regimes de múltiplas injecções diárias e de sistemas de perfusão (bombas de insulina) pode ser feita em gramas ou em porções de 10, 12 ou 15 gramas. De modo a obter melhor controlo da glicémia pós-prandial, tal contabilização deve ser rigorosa, com recurso a leitura de rótulos e a pesagem dos alimentos.

A possibilidade de ajustar a insulina à quantidade de hidratos de carbono ingerida nos regimes de múltiplas injeções diárias permite muito maior flexibilidade no suprimento e no horário das refeições. No entanto, é essencial estabelecer um plano de educação alimentar em que seja valorizado o equilíbrio nutricional. Para além da avaliação do risco de suprimento excessivo de gorduras e proteínas, é ainda necessário ter em conta que o teor da refeição em gorduras e proteínas influencia também a glicémia pos-prandial.

Para garantir a glicémia pós-prandial “fisiológica” é também importante ter a noção do chamado índice glicémico dos hidratos de carbono, tentando identificar os que provocam maiores subidas de glicémia. A este propósito, é fundamental que a sacarose, devidamente contabilizada, não ultrapasse 10% do VCT diário.

A regularidade das refeições, a existência de rotinas e as refeições em família são importantes contributos para a melhoria do controlo metabólico.

A composição das pequenas refeições intermédias e a sua distribuição ao longo do dia requerem particular atenção. Com efeito, múltiplos lanches durante o dia, muitas vezes sem prévia administração de insulina, podem ser um factor de mau controlo metabólico.

Em suma, a educação alimentar deve ser dirigida à criança, jovem e família, tendo em atenção que o comportamento alimentar, algo mais do que a simples ingestão de alimentos, é influenciado por factores culturais e psicossociais que devem ser respeitados.

Actividade física

As crianças e adolescentes com diabetes podem praticar todos os tipos de exercício físico, incluindo desportos de competição, necessitando, no entanto, de algumas regras práticas para ajuste do tratamento.

Os regimes de múltiplas injecções diárias e a bomba de insulina facilitam esta adaptação que depende principalmente da insulina em acção durante o exercício e do tipo e duração do mesmo.

Os efeitos do exercício físico sobre a glicémia são complexos e envolvem vários factores.

Em condições fisiológicas ditas normais, o exercício físico acompanha-se de diminuição da secreção de insulina e aumento da libertação de hormonas contrarreguladoras de modo a aumentar a produção hepática de glicose compensadora da sua maior captação pelo músculo.

Na diabetes tipo 1, os níveis de insulina circulante estão condicionados pela sua administração exógena; não sendo naturalmente suprimidos, inibem, no entanto, a produção de glicose pelo fígado. Em situação de normal controlo glicémico o principal risco será a ocorrência de hipoglicémia durante ou após o exercício.

O risco de hipoglicémia pode manter-se até 24 horas depois do exercício, inclusivamente durante a noite, e sobretudo se foi prolongado e intenso. Este facto deve-se ao efeito tardio do aumento de sensibilidade à insulina, acrescido duma reposição mais lenta dos depósitos de glicogénio hepático e muscular.

O aumento de absorção da insulina a partir do local de injecção, possível factor agravante, deve ser tido em consideração.

Quando a glicémia pré-exercício é elevada (> 250 mg/dL), os níveis de insulina circulante poderão não ser suficientes para compensar o efeito da libertação de hormonas contrarreguladoras incorrendo no risco de agravamento de hiperglicémia e formação de corpos cetónicos. De salientar que mesmo em indivíduos com bom controlo se verifica que a hiperglicémia na altura do exercício físico pode afectar a libertação de endorfinas e comprometer o rendimento.

Para ajustar o tratamento à prática do exercício físico, algumas regras práticas individualizadas para cada criança devem ser cumpridas:

  • na presença de glicémia > 250 mg/dL com cetonémia > 0,5 mmol/L, esta deve ser corrigida e o início da actividade adiado;
  • quando o exercício vai ocorrer durante um pico de acção de insulina, a dose desta deve ser significativamente reduzida; o grau de redução deve ser individualizado e estabelecido também de acordo com o tipo de exercício e com o efeito previsto baseado em determinações de glicémia;
  • a bomba de insulina deve ser desconectada ou programada para um ritmo basal temporário, pelo menos 90 minutos antes, de modo a reduzir o nível de insulina em acção durante o exercício;
  • no caso de exercício mais intenso no final da tarde ou noite, a insulina basal da noite (ou a programar na bomba) deve ser reduzida pelo menos em 10-20%;
  • o local de injecção deve ser seleccionado de modo a poupar a zona mais envolvida na actividade muscular;
  • quando o exercício não é programado, ou quando a sua intensidade é superior ao habitual, poderá ser necessário suprimento extra de hidratos de carbono calculado também de acordo com a duração, o tipo de exercício e a insulina em acção;
  • como regra geral recomenda-se ingestão de 10-15 gramas de hidratos de carbono de fácil digestão por cada 30-60 minutos de desporto (existem publicadas regras para este cálculo de acordo com os vários tipos de desporto e o peso corporal da criança);
  • todas as crianças com diabetes devem estar identificadas como tal, com informação pormenorizada ao treinador ou professor de educação física de modo a serem tomadas todas as medidas de prevenção e eventual tratamento da hipoglicémia;
  • a criança deve ser integrada nas classes normais para o seu grupo etário, sem restrições.

Como nota final, importa relevar que tão importante como a prática desportiva é a aquisição de hábitos que promovem uma vida activa; nesta perspectiva, há que estimular a tendência natural da criança e jovem para os jogos e actividades de grupo, tentando reduzir o tempo de passividade e sedentarismo, como o passado em frente do televisor e/ou com jogos electrónicos.

Educação e aspectos psicossociais

A actual prática quase generalizada de esquemas de insulina com múltiplas injecções diárias doseadas de acordo com vários parâmetros (glicémia, quantidade de hidratos de carbono da refeição e grau de actividade física), assim como a disponibilidade de sistemas cada vez mais sofisticados de perfusão subcutânea contínua de insulina e de monitorização da glicose, vieram melhorar o controlo metabólico e as perspectivas de futuro com maior qualidade de vida.

No entanto, o preço desta evolução tem sido o aumento diário das solicitações e exigências para os pais, crianças e adolescentes para tarefas não intuitivas, muitas vezes dificilmente conciliáveis com as suas rotinas anteriores comporta certo risco de não adesão.

De facto, está provado que qualquer regime (no contexto da afeção em causa) só resultará se as crianças/jovens e famílias forem envolvidos, capacitados e motivados para levar a cabo rotinas de vida diferentes.

Para que tal seja conseguido é fundamental a existência de:

  • plano estruturado de educação terapêutica dirigido à criança/jovem e família, adaptado às várias etapas do neurodesenvolvimento;
  • objectivos individualizados e claros de controlo, tentando detectar possíveis obstáculos à sua prossecução.

Assim, a equipa multidisciplinar devotada à prestação de cuidados à criança e jovem com diabetes, deve:

  • estar atenta e ser proactiva em relação às alterações da dinâmica familiar, às exigências das várias etapas do desenvolvimento e às situações de conflito susceptíveis de constituir barreiras à adesão terapêutica;
  • estar disponível para contacto e para providenciar apoio emocional.

Actuação em situações especiais

Criança com diabetes na escola

A informação aos professores e a colaboração destes permitirão alcançar a adequada integração escolar da criança com diabetes, contribuindo para melhorar os cuidados assistenciais quotidianos. O professor de educação física deve ter informação especial contemplando os aspetos relacionados com o exercício físico.

Os cuidados a prestar no âmbito da escola estão previstos numa Orientação da DGS 003/2012, integrando o Programa Nacional de Saúde Escolar e o Programa Nacional para a Diabetes.

Infecções intercorrentes

Durante as infecções intercorrentes é necessário adaptar o tratamento de modo a prevenir hiperglicémia, cetose ou hipoglicémia.

As necessidades de insulina aumentam logo no período de incubação das infecções e mantêm-se elevadas até depois da cura clínica da doença.

A criança pode, em tais situações, apresentar diminuição do apetite ou mesmo recusa alimentar, mas a dose diária nunca deve ser suspensa, necessitando mesmo, na maioria dos casos, ser aumentada. Pelo contrário, nos casos de gastrenterite, em geral a insulina basal necessita de ser diminuída.

A determinação de glicémia e cetonémia deve ser frequente, em cada 1-3 horas, mesmo durante a noite. Devem ser administradas doses suplementares de insulina de acção rápida em função, quer da glicémia capilar, quer do suprimento em hidratos de carbono. Refira-se, a propósito, que a pesquisa sistemática de cetonémia poderá alertar precocemente para a presença de infecção, mesmo antes de detectada febre ou outras manifestações.

Como se compreende, a sacarose eventualmente veiculada em xaropes ou suspensões orais não inviabiliza o controlo metabólico desde que o ajuste de insulina seja adequado.

A verificação de vómitos ou cetonémia persistentes obrigará ao recurso a centro hospitalar especializado para eventual fluidoterapia endovenosa de modo a prevenir a desidratação e a cetoacidose.

Intervenção cirúrgica

A cirurgia, sempre que possível, deve ter lugar em centros com apoio especializado e protocolos de actuação claros. Tratando-se de intervenção programada, a mesma deverá ter lugar no primeiro período matinal. Em presença de mau controlo metabólico, fora de situações emergentes, deverá ser protelada.

As doses habituais de insulina do doente devem ser reavaliadas no dia anterior, sendo necessário manter a insulinoterapia mesmo durante o jejum pré-operatório para evitar cetose e cetoacidose.

Em caso de cirurgia major (duração > 2 horas) é necessário iniciar pré-operatoriamente a perfusão endovenosa de insulina com ritmo ajustável de acordo com determinações muito frequentes de glicémia (em geral, de hora a hora) tendo como objectivo manter valores de glicémia entre 90 e 180 mg /dL.

Complicações agudas
Cetoacidose

A cetoacidose diabética (CAD), a emergência hiperglicémica mais frequente em doentes diabéticos, é mais comum nos casos inaugurais, na proporção estimada variando entre 15-80%; esta heterogeneidade não está completamente esclarecida.

Constituindo a causa mais frequente de morte relacionada com a diabetes (0,7 a 1%), a respectiva patogénese relaciona-se na maioria dos casos com edema cerebral. O maior risco ocorre aquando do primeiro episódio, nas primeiras 24 horas, e na idade inferior a 5 anos.

A CAD resulta de uma cascata de alterações desencadeadas por um défice grave de insulina associado ao excesso de hormonas contrarreguladoras (Figura 2).

Assim:

  1. a hiperglicémia (aumento da produção de glicose e diminuição da sua utilização periférica) leva a diurese osmótica, desidratação, activação do sistema renina-angiotensina e perda de electrólitos. A intensidade e duração deste quadro aumenta o risco de edema cerebral;
  2. aumento de ácidos gordos livres (AGL) em circulação fornece substracto para a produção e acumulação de corpos cetónicos, do que resulta acidose metabólica.

O tratamento deve atender às múltiplas vertentes da descompensação (factor desencadeante, insulinopenia e alterações fisiopatológicas decorrentes).

Durante a fase de correcção são várias as complicações possíveis, constituindo o edema cerebral a mais grave.

Este pode estar relacionado com correcção excessiva ou demasiadamente rápida do desequilíbrio hidro-electrolítico e da acidose, pelo que importa seguir um protocolo de actuação especializado em unidade de cuidados intensivos (ver capítulo seguinte).

FIGURA 2. Fisiopatologia da CAD

Hipoglicémia

Trata-se da complicação aguda mais frequente da DM1, definida como valor de glicémia inferior a 70 mg/dL independentemente de haver ou não sinais e sintomas associados.

A hipoglicémia nos doentes com DM1 pode ocorrer numa proporção significativa mesmo em indivíduos correctamente controlados. A incidência de episódios ligeiros ou moderados é mal conhecida, estando em regra apenas registados os casos de hipoglicémia grave.

Podendo resultar de diversas circunstâncias, de um modo geral surge por excesso relativo de insulina em relação à glicémia (por ex. em presença de:

  • alteração da dose ou do horário de administração;
  • variações na absorção da insulina ou da sensibilidade à mesma;
  • exercício físico;
  • cálculo de dose excessivo para o suprimento de hidratos de carbono).

Dado que, após um primeiro episódio de hipoglicémia, as respostas autonómicas a subsequentes episódios ficam reduzidas, a probabilidade de detecção dos respectivos sinais pelo próprio doente vai-se também reduzindo com o tempo.

Os sintomas clássicos de hipoglicémia são: tremores, taquicárdia, diaforese, dores abdominais, e ansiedade (em relação com libertação de catecolaminas), cefaleia, irritabilidade, estado confusional, alterações do comportamento, “birras”, convulsões focais ou generalizadas, e coma (em relação com neuroglicopénia de grau variável).

A preocupação com as medidas de prevenção deve ser tanto maior quanto menor a idade da criança (sobretudo até aos 6 anos). No caso de episódios ligeiros a moderados, a actuação inclui administração oral de açúcares de absorção rápida (glucose, sacarose) 0,3 g/kg de glucose (9-15 gramas de glucose).

A glicémia deve ser reavaliada após 10-15 minutos, repetindo se necessário a administração oral de glucose. Atingida a melhoria de sintomas ou normoglicémia, a criança deve ingerir hidratos de carbono complexos para prevenir a recorrência de hipoglicémia (refeição ligeira composta por pão, bolachas, fruta ou a refeição prevista no caso de o episódio ocorrer imediatamente antes desta).

 Em situações mais graves que levam ao coma ou a convulsões, a actuação de emergência inclui a administração de glucagom injectável por via subcutânea ou intramuscular na dose de 0,5-1 mg (1/2 ampola a 1 ampola, respectivamente antes e depois dos 12 anos de idade, ou 10-30 mcg/kg de peso corporal). O efeito verifica-se em 10-15 minutos.

Em meio hospitalar, pressupondo-se vigilância rigorosa contínua da glicémia, procede-se a perfusão endovenosa de glucose durante alguns minutos na dose total de 200-500 mg de glicose/kg de peso corporal, sendo que glicose a 10% fornece 100 mg/mL). Salienta-se que a administração demasiadamente rápida ou em concentração excessiva pode levar a alteração brusca de osmolaridade com risco de edema cerebral.

Complicações tardias

As complicações tardias da diabetes incluem retinopatia, nefropatia, neuropatia e doença macrovascular.

Embora um controlo metabólico correcto diminua significativamente as complicações da DM1 e estas sejam raras antes da puberdade, torna-se obrigatório realizar de modo sistemático o respectivo rastreio.

O rastreio de retinopatia deve ter início a partir dos 10 anos de idade e após 2 anos de evolução da diabetes.

O exame oftalmológico inicial permite excluir alterações prévias, nomeadamente congénitas. O rastreio deve ser feito anualmente por fundoscopia.

O rastreio de microalbuminúria indicado a partir dos 10 anos de idade permite detectar disfunção renal e risco de progressão para nefropatia; o tratamento com inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) pode prevenir a progressão para proteinúria.

A vigilância frequente da pressão arterial em cada consulta, ou sempre que os sinais clínicos o indiquem, tem como objectivo a detecção da hipertensão arterial e início de tratamento. O tratamento farmacológico com IECA é recomendado sempre que os valores atinjam ou ultrapassem o percentil 95.

O rastreio de dislipoproteinémia é recomendado a partir dos 10 anos de idade, ou dos 2 anos se houver antecedentes de tal alteração ou de doença cardiovascular.

O rastreio da neuropatia periférica e autonómica, rara na idade pediátrica, deve ser realizado a partir dos 10 anos de idade evolução da diabetes.

2. Diabetes mellitus tipo 2 (DM2)

Definição e importância do problema

A diabetes tipo 2 (DM2) é uma perturbação do metabolismo dos hidratos de carbono que cursa com hiperglicémia e secundário a alterações do mecanismo de acção periférica da insulina e da capacidade funcional das células beta. Tratando-se duma forma de diabetes anteriormente considerada como própria do adulto, importa salientar que na actualidade a sua prevalência é crescente na idade pediátrica, manifestando-se em idades cada vez mais baixas designadamente em associação a obesidade cuja incidência tem aumentado.

Etiopatogénese

Esta forma de diabetes é comparticipada pela influência de factores genéticos, epigenéticos e ambientais.

Classicamente considera-se que a perturbação metabólica mais precoce nos indivíduos que desenvolvem DM2 é a resistência à acção da insulina, em geral associada a obesidade como foi referido. Em tal fase evolutiva, a resistência à insulina (IR) implica que, para exercer os mesmos efeitos biológicos, é necessária secreção aumentada de compensação, levando a hiperinsulinémia (sem hiperglicémia) – 1ª fase.

A diabetes aparece mais tarde quando a capacidade funcional do pâncreas se esgota, sendo incapaz de produzir a quantidade de insulina necessária para fazer frente às necessidades aumentadas (deficiência relativa de insulina) – 2ª fase.

Contudo, admite-se na actualidade que ambas as fases (1ª + 2ª) poderão coexistir desde os primeiros estádios da doença. Nos casos de obesidade verifica-se o seguinte fenómeno: para que a DM2 ocorra é necessária a coexistência de IR e de inadequada secreção compensatória de insulina; todos os indivíduos obesos terão IR, mas só naqueles em que não ocorre aumento compensatório da secreção de insulina verificará DM2.

Nos casos de obesidade, concomitantemente com a resistência à insulina, verifica-se aumento de produção de glucose hepática que, secundariamente, leva à diminuição da capacidade de secreção de insulina (em condições normais induzida pela glucose).

Ao longo do tempo verifica-se fenómeno de glucotoxicidade (pela hiperglicémia crónica) e de lipotoxicidade (pela hiperlipémia crónica) sobre as células b dos ilhéus, do qual resulta diminuição da expressão do gene da insulina.

A resistência à insulina faz parte da síndroma metabólica, típica na DM2, a qual inclui também obesidade abdominal, desregulação do metabolismo da glucose, dislipidémia e HTA.

Embora seja admitido que na DM2 não existe destruição autoimune das células b, em certos casos têm sido identificados alguns marcadores autoimunes (autoanticorpos) que também surgem na DM1, tais como GAD 65, ICA 512 e IAA.

Em adultos verifica-se já uma redução de 50% da secreção de insulina na altura do diagnóstico de DM2. Dados do estudo TODAY (Treatment Options for DM2 in Adolescents and Young) sugerem que esta perda é mais rápida nos adolescentes.

Tendo sido referido o papel de factores genéticos, epigenéticos e ambientais na génese e evolução a médio e longo prazo da DM2, importa salientar a comparticipação do baixo peso de nascimento, da RCIU e da obesidade.

O baixo peso de nascimento e a RCIU estão associados a risco elevado de DM2; admite-se um fenómeno de programação in utero (hipótese do fenótipo da poupança): o feto adapta-se à má nutrição, poupando os nutrientes e maximizando o seu armazenamento deficiente. Neste contexto, o risco parece ser maior nas crianças com ganhos de peso mais rápidos nos primeiros meses de vida por suprimento elevado de energia e proteínas.

A obesidade, relacionada com factores etiopatogénicos nutricionais, está associada ao desenvolvimento de DM2, o que se relaciona fundamentalmente com resistência à insulina. A gordura visceral, sendo metabolicamente activa, produz adipocinas que contribuem para a referida IR e igualmente para a disfunção endotelial com consequente risco cardiovascular. Efectivamente, cerca de 90% de indivíduos com DM2 são obesos. No entanto, a dieta hipercalórica pode constituir factor de risco independente.

Admite-se actualmente também a intervenção de factores epigenéticos; com efeito, alguns poluentes ambientais poderão intervir na etiopatogénese e progressão da DM2, encontrando-se ainda a sua identificação em fase de investigação.

Aspectos epidemiológicos

A DM2, anteriormente considerada de baixa prevalência em idade pediátrica, evidencia hoje prevalência crescente em relação com o aumento da obesidade.

O pico de incidência situa-se na segunda década de vida coincidindo com o pico de aumento fisiológico de IR da puberdade. A prevalência é variável com a etnia.

Nos EUA e Europa quase todos os casos se associam a um índice de massa corporal (IMC) acima do percentil 85, registando-se maior frequência em populações com níveis socioeconómicos e educacionais mais baixos.

Outros exames diagnósticos (a realizar apenas em centros especializados de diabetologia pediátrica e perante situações duvidosas ou necessidade de classificação definitiva do tipo de diabetes) são a determinação da insulinémia e do péptido C em jejum.*

Utilizando-se o péptido C na DM1 estabelecida, os seus valores são baixos (< 0,6 ng/mL), não aumentando após refeição ou administração de glucose; contudo, em fases iniciais tal marcador pode evidenciar valores dentro dos limites da normalidade. Com as limitações atrás referidas, podem ser detectados anticorpos ICA, GADA e IAA.

*Recorda-se que a biossíntese do polipéptido designado por insulina (a partir das células beta dos ilhéus de Langerhans), ocorre com a libertação na corrente sanguínea de quantidades equimolares de insulina e do chamado péptido C.

O péptido C constitui um bom marcador da função das células beta e, por isso, da reserva e da produção endógena de insulina; por outro lado, o seu valor sanguíneo (normal ~1,1-5,0 ng/mL), com uma vida média cinco a dez vezes superior à da insulina endógena, não é influenciado pela administração exógena de insulina, nem pela existência de anticorpos anti-insulina. Em determinadas situações o valor de péptido C está elevado; por ex. insuficiência renal, hipopotassémia, síndroma de Cushing e gravidez.

Manifestações clínicas

Apesar de poder descrever-se um quadro clínico típico de DM2 devido à actual prevalência de obesidade a distinção entre DM1 e DM2 poderá ser difícil dado que numa percentagem significativa das crianças e adolescentes com DM1 se verifica obesidade. Por outro lado, a DM2 pode manifestar-se com um quadro de descompensação metabólica com cetose ou mesmo, ainda que mais raramente, com cetoacidose.

Na DM2 aplicam-se idênticos critérios de diagnóstico de DM1, já referidos na alínea 1.; pode ser confirmada pela determinação da insulinémia e do péptido C em jejum.

A HbA1c tende a ser de valor mais elevado.

A pesquisa de autoanticorpos contra células b é negativa (excepção para ICA512 -ver atrás).

Os casos de obesidade, de alterações metabólicas associadas e de antecedentes familiares de DM2 comportam risco de desenvolvimento do mesmo tipo de DM.

A verificação de acanthosis nigricans (manifestação dermatológica de hiperinsulinismo sob a forma de pigmentação com hiperqueratose notória na nuca e nas pregas de flexão, verificada em 90% dos casos), de obesidade (em 80-90% dos casos), de síndroma do ovário poliquístico na rapariga obesa, de história familiar de DM2, e a ausência de anticorpos contra os antigénios das células b dos ilhéus de Langerhans, apontam para a forte possibilidade de DM2 no doente em estudo.

De salientar que a acanthosis nigricans pode ser considerada um marcador (e levar à suspeita) de resistência à insulina, de hiperinsulinémia e, eventualmente, de DM2.

A cetoacidose, embora menos frequente que na DM1, pode ocorrer, sobretudo em situações de estresse ou infecção intercorrente.

Tratamento

Sempre que o diagnóstico seja feito em cetose ou cetoacidose é necessário iniciar de imediato tratamento com insulina.

Os casos duvidosos, sem certeza de diagnóstico diferencial com DM1 ou quando apresentam glicémia ocasional ≥ 250 mg/dL ou HbA1c ≥ 9% têm também indicação para início de insulinoterapia.

Quando em presença de um quadro típico de DM2, sem dúvidas de diagnóstico, confirmando-se que não existe cetose, que a glicémia é inferior a 250 mg/dL e a HbA1c < 9%, é possível a abordagem terapêutica com modificação do estilo de vida (alimentação saudável e actividade física). No entanto, devido à baixa taxa de sucesso destas medidas, deve proceder-se desde o início à terapêutica farmacológica com hipoglicemiantes orais.

Hipoglicemiantes orais

Apesar de estarem disponíveis numerosos hipoglicemiantes orais, para o tratamento da criança e adolescente, apenas se encontra actualmente aprovado em Portugal, como na maioria dos países, a metformina.

A metformina actua a nível do músculo, tecido adiposo e predominantemente a nível hepático. Reduz a libertação de glicose pelo fígado, diminuindo a neoglicogénese e aumenta também a captação de glicose estimulada pela insulina a nível do músculo e do tecido adiposo. Tem ainda um efeito inicial de redução de apetite sem risco de hipoglicémia quando utilizada em monoterapia.

No início de tratamento poderão ocorrer sintomas gastrintestinais, nomeadamente diarreia, náuseas e dor abdominal transitórias, pelo que a dose diária inicial deve ser de 500 mg, aumentando-a gradualmente em 3-4 semanas (dose máxima de 2000 mg).

Em caso de doença gastrintestinal deve ser suspensa a medicação, bem como antes da realização de exame radiológico com contraste. Em situações normais o risco de acidose láctica é residual.

A metformina pode utilizar-se em associação com insulina.

Nos casos de diabetes tipo 2 medicados com metformina, esta medicação deve ser suspensa pelo menos 24 horas antes (em caso de cirurgia major deve também ser iniciada insulina em perfusão endovenosa) e nas 48 horas seguintes até estar confirmada a normalidade da função renal.

Considerando os fármacos com efeito estimulante da secreção de insulina cabe referir ainda o GLP-1 (glucagon like peptide 1) que igualmente suprime a resposta do glucagom, atrasa o esvaziamento gástrico e promove a saciedade. Este péptido é segregado em condições normais pelas células L do intestino delgado.

A sua utilização não está aprovada abaixo dos 18 anos de idade; no entanto, encontram-se actualmente em curso estudos em adolescentes.

Insulina

Excepto na fase de descompensação aguda, uma dose única de insulina basal (NPH ou análogo da acção lenta) na dose de 0,2-0,3 Unidades/kg pode ser suficiente, em associação com metformina. Quando o objectivo de controlo não é deste modo atingido, pode ser indicado acrescentar bolus prandiais de insulina de acção rápida.

3. Outros tipos de diabetes mellitus

De modo sucinto são discriminados outros tipos específicos de DM, mais raros, alguns dos quais partilham características, quer com a DM1, quer com a DM2.

Defeitos genéticos da função das células beta

Compreende as formas:

  • DM monogénica dita anteriormente MODY (sigla do inglês – maturity onset diabetes of youth); e
  • DM por defeitos mitocondriais; estes subtipos estão relacionados com defeitos hereditários de genes mitocondriais das células b dos ilhéus.
Defeitos genéticos influenciando a acção da insulina
  • Trata-se de situações muito raras relacionadas com mutações de genes do receptor da insulina: resistência à insulina tipo A, leprechaunismo, síndroma de Rabson-Mendenhall, diabetes lipoatrófica e síndroma stiff-man/ “homem rígido” (doença autoimune do SNC, caracterizada por espasmos dolorosos e rigidez progressiva, extremamente rara e títulos elevados de anticorpos anti-descarboxilase do ácido glutâmico) (ver Glossário Geral).
DM neonatal         

Inclui:

  1. a diabetes transitória do RN;
  2. a diabetes permanente do RN;
  3. a diabetes transitória do RN com recorrência 7-20 anos mais tarde; (ver adiante)
  4. a síndroma IPEX (sigla de Imunodesregulação, Poliendocrinopatia, Enteropatia e ligada ao cromossoma X) com quadro de diabetes autoimune, em > 90% dos casos desenvolvendo-se na 1ª semana de vida;
  5. defeitos do gene da insulina, situação rara.
Doenças do pâncreas exócrino

São referidas como mais representativas as seguintes situações: pancreatite, lesões traumáticas, pancreatectomia, neoplasia, fibrose quística, hemocromatose, pancreatopatia fibrocalculosa. Especial ênfase deve ser dada à entidade designada por diabetes relacionada com a fibrose quística (DRFC) com características, quer de DM1, quer de DM2 por destruição de ilhéus, substituídos por fibrose e tecido adiposo.

Doenças autoimunes
  • Tiroidite de Hashimoto (tiroidite linfocítica crónica) e a doença celíaca frequentemente associadas a DM1 como foi referido na alínea 1.
Endocrinopatias
  • Citam-se as seguintes: acromegália, síndroma de Cushing, glucagonoma, feocromocitoma, hipertiroidismo, somatostatinoma, etc..
Fármacos e agentes químicos
  • Como exemplos são referidos os seguintes: pentamidina, ácido nicotínico, glucocorticóides, hormona tiroideia, diazóxido, agonistas beta-adrenérgicos, alfa-interferão, etc.; em geral está em causa acção de toxicidade sobre as células beta.
Infecções
  • Já abordadas anteriormente, deste modo sistematizado cabe salientar: rubéola congénita e citomegalovírus.
Síndromas genéticas
  • Síndromas Down, Klinefelter, Turner, Wolfram, Prader-Willi, Laurence-Moon-Biedl, Ataxia de Friedreich, Coreia de Huntigton, Porfíria, Cockaine, Werner, etc.;
  • Muitas destas síndromas, embora raras, são modelos que permitem a compreensão das diversas perturbações do metabolismo dos hidratos de carbono.
Diabetes gestacional
  • Durante a gestação verifica-se intolerância anormal à glucose durante a gravidez (regredindo após o parto), que comporta risco significativo de DM, em geral do tipo MODY.

No âmbito da alínea 3., dois tipos de diabetes monogénica com especial relevância em idade pediátrica – MODY (maturity onset diabetes of the young – diabetes juvenil de início no adulto) e Diabetes neonatal – são referidos mais pormenorizadamente.

Na prática clínica importa fazer referência a certos aspectos semiológicos, traduzindo certas atipias que sugerem a probabilidade de diabetes monogénica, a saber:

  • em casos diagnosticados como DM1 – diagnóstico nos primeiros 6 meses de vida ou antecedentes familiares de diabetes num dos progenitores e noutros parentes em primeiro grau; – ausência de autoanticorpos na data do diagnóstico; – função das células beta relativamente preservada traduzindo-se por baixas necessidades de insulina e péptido C com valores normais;
  • em casos diagnosticados como DM2 – ausência de obesidade, de acantose e de outros marcadores de síndroma metabólica em indivíduos pertencentes a etnias com baixa incidência de DM2 e com história familiar de diabetes, mas não de obesidade.

1. DM monogénica dita anteriormente MODY (sigla do inglês – maturity onset diabetes of youth)
Compreende um grupo de formas relativamente ligeiras de diabetes associadas a defeito primário na secreção de insulina, sem cetose nem acidose, com péptido C baixo, HbA1c ligeiramente elevada, têm em comum a hereditariedade dominante e o início antes dos 25 anos de idade.
Como critérios estritos do diagnóstico de MODY, incluem-se: diabetes em pelo menos três gerações com pelo menos um indivíduo afectado.
Entre as mutações identificadas em pelo menos 10 genes, na sua maioria em heterozigotia, são mais frequentes (90%) as dos seguintes genes: GCK/gene da enzima glucocinase (MODY 2), e de genes de vários factores de transcrição – HNF4-alfa/gene do factor de transcrição (MODY 1), HNF1-alfa/gene do factor de transcrição (MODY 3), e HNF1-beta/gene do factor de transcrição (MODY 5). A forma MODY 1 é mais frequente em adultos.
A importância da realização do diagnóstico molecular radica nas implicações quanto ao tratamento: por ex. o subtipo MODY 2 não requer qualquer tratamento, enquanto nos restantes está indicada a utilização de hipoglicemiantes (sulfonilureias) em doses baixas.

2. Diabetes mellitus neonatal
Esta forma rara tem início nos primeiros 6 meses de vida, em geral associada a RCIU, o que reflecte défice pré-natal de insulina, hormona que promove o crescimento intrauterino.

Distinguem-se duas formas clínicas:

  1. Diabetes neonatal transitória
    Esta forma em geral dura em média 3-4 meses, tendendo a reaparecer na idade escolar ou adolescência numa proporção ~50%.
    A alteração genética mais frequente consiste numa alteração de imprinting dos genes ZAC e HYAM1 [Cr 6q24] que codificam reguladores da apoptose.
    Está indicado o tratamento com insulina regular (1-2 Unidades/kg/dia) em duas doses, com redução progressiva dependendo da evolução.
  2. Diabetes neonatal permanente
    A alteração genética mais frequente é uma mutação nos genes KCNJ11 e ABCC8 que codificam subunidades do canal de K+ ATP-dependente da célula β pancreáticas ou no gene da própria insulina, traduzindo-se em anomalias no processo secretório ao nível das células β.
    De referir que ambos os genes do canal de potássio também se têm relacionado com alguns casos de diabetes neonatal transitória.
    Na maioria dos casos (~90%) com mutações nos genes KCNJ11 e ABCC8 está indicado o tratamento com sulfonilureia, por vezes na sequência de tempo de tratamento com insulina.

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