Definição e importância do problema

A síndroma nefrótica (SN) define-se pela coexistência de proteinúria maciça (≥ 40 mg/m2/hora ou relação proteínas/creatinina na urina > 2,0 mg/mg), hipoproteinémia (< 5,5 g/dL) e hipoalbuminémia (< 2,5 g/dL), edema e hiperlipidémia.

A síndroma nefrótica idiopática (SNI), que corresponde a cerca de 90% dos casos das síndromas nefróticas, é a glomerulopatia mais frequente na idade pediátrica, com uma incidência de 2-7 novos casos/ano por 100.000 com idade inferior a 18 anos e uma prevalência de 16 casos por cada 100.000. O sexo masculino é duas vezes mais afectado do que o sexo feminino, embora na adolescência este predomínio deixe de existir.

Em 1978 o trabalho publicado pelo grupo do projecto Estudo Internacional das Doenças Renais na Criança (ISKDC, sigla de International Study for Kidney Diseases in Children) determinou as características histopatológicas, clínicas e laboratoriais da síndroma nefrótica (SN) na criança e demonstrou que a doença das lesões mínimas (LM) é responsável por cerca de 76% dos casos de síndroma nefrótica idiopática. Cerca de 95% dos doentes com LM responde à corticoterapia; no entanto, em cerca de 75% destes verifica-se recaída da doença, e em 50%, necessidade de corticoterapia mais prolongada, o que aumenta o risco de efeitos secundários relacionado com tal terapia.

Salienta-se, a propósito, que a resposta ao tratamento com corticóides constitui o factor mais importante para a determinação do prognóstico a longo prazo.

Os principais objectivos da abordagem inicial de uma criança com um primeiro episódio de SN são:

  • Confirmar a existência da SN;
  • Avaliar se se trata de SN primária ou secundária (Quadro 1), excluindo outras patologias renais que se apresentem com edema ou hipoalbuminémia (glomerulonefrite aguda ou crónica, síndroma hemolítica urémica, doença renal crónica);
  • Investigar eventuais complicações (infecção, trombose, insuficiência renal, hipovolémia);
  • Iniciar tratamento adequado o mais precocemente possível.

QUADRO 1 – Classificação da síndroma nefrótica na idade pediátrica

Adaptado de Pasini A, Benetti E, Conti G, et al. The Italian Society for Pediatric Nephrology (SINePe). Italian J Pediatr 2017; 43:41

– Síndroma nefrótica primária (95% <> idade 0-12 anos)

    • Síndroma nefrótica idiopática (80-90% <> idade 2-8 anos)
    • Síndroma nefrótica corticossensível
    • Síndroma nefrótica corticorresistente
    • Síndroma nefrótica genética (isolada ou sindromática)
    • 95-100% dos casos de SN congénita (<> idade < 3 meses)
    • 50-60% dos casos de SN infantil (<> idade 4-12 meses)

Síndroma nefrótica secundária (5% <> idade 0-12 anos)

    • Vasculites/doenças autoimunes (lúpus eritematoso sistémico, poliangeíte microscópica, síndroma de Goodpasture, púrpura de Henoch-Schönlein, nefropatia por IgA)
    • Infecção (por VHB, VHC, VIH, VEB, CMV, PVB19, Mycoplasma pneumoniae, Treponema pallidum, Toxoplasma, Plasmodium, parasitas)
    • Agentes químicos /fármacos (anti-inflamatórios não esteróides, tiopronina, penicilamina, sais de ouro, pamidronato, interferão, everolimus, antirretrovíricos, quimioterapêuticos, lítio, heroína)
    • Diabetes
    • Cancro (Linfomas, leucemia)

Fisiopatologia

Os rins utilizam um complexo sistema de filtração conhecido como barreira de filtração glomerular (BFG). Esta barreira é constituída pela membrana basal glomerular, pelo endotélio fenestrado e pela camada epitelial composta por podócitos. A BFG com uma área uma carga eléctrica específicos, permite permeabilidade para a água e solutos através dos seus poros em direcção ao espaço urinário.

Na SN a alteração das cargas negativas na membrana basal glomerular resulta na fusão dos podócitos, na perda dos diafragmas dos poros, no aumento da permeabilidade da BFG e na perda de albumina e outras proteínas na urina. Poderá também estar em causa um factor plasmático produzido pelos linfócitos conduzindo a aumento da referida permeabilidade.

Na maior parte dos estudos relacionados com os mecanismos patogénicos da síndroma nefrótica idiopática é explorado o papel do sistema imunológico e dos podócitos na génese da doença. Há várias teorias que incluem: – 1) disfunção das células T com libertação de citocinas que afectam os glomérulos, aumentando a sua permeabilidade; – 2) alteração do sistema imunológico que conduz à produção de factores circulantes que alteram a estrutura/função dos podócitos, originando perda de proteínas.

Admite-se que: – as células B também possam estar envolvidas na génese da SN, uma vez que há estudos que reportam remissões após administração de anticorpo anti CD20 (rituximab).

Na actualidade, não há ainda evidências definitivas acerca dos mecanismos patogénicos envolvidos.

Em relação ao edema na SN, há 2 mecanismos diferentes que explicam sua génese. No mecanismo da contracção vascular, a perda de albumina na urina leva à hipoalbuminémia e esta à diminuição da pressão oncótica intravascular, o que permite a passagem transcapilar de água e outros solutos para os tecidos. Em consequência das alterações hemodinâmicas que se registam, há contracção do volume intravascular e activação do sistema renina-angiotensina-aldosterona com retenção de sódio e água, e perpetuação do edema. Igualmente, a contracção do volume intravascular estimula a hormona antidiurética com consequente incremento da reabsorção de água nos tubos colectores. Por sua vez, a hipoalbuminémia estimula a síntese de colesterol-LDL e de triglicéridos, explicando a hiperlipidémia.

No mecanismo de expansão vascular considera-se que a proteinúria origina a retenção primária intrarrenal de sódio e água. Esta retenção, independente do sistema renina-angiotensina-aldosterona, é causada pela activação dos canais epiteliais de sódio nos túbulos distais, originando hipervolémia e perpetuação do edema.

De referir, no entanto, que os mecanismos descritos não se aplicam a todos os casos de SN, pois há situações que cursam com hipervolémia e diminuição do nível sérico de renina e de aldosterona.

Descreve-se igualmente um mecanismo genético que está subjacente na maioria das SN congénitas e familiares e também pode aparecer em SN esporádicas e de qualquer idade. Efectivamente, são conhecidas mutações nos genes (NPHS2, FSGS1, NPHS1) que, codificando proteínas que participam no desenvolvimento e estrutura das células epiteliais glomerulares (podócitos) a diversos níveis (podocina, alfa-actinina 4, nefrina), conduzem a alterações estruturais.

Outros genes (como WT1, MYH9 e LMX1B, e NEPH1) poderão explicar alterações estruturais de outros componentes do aparelho de filtração glomerular como a fenda interpodocitária.

No âmbito das SN genéticas, as mutações nos genes NPHS1, NPHS2 (gene no cromossoma 19q13.1- SN tipo finlandês), WT1 e LAMB2 explicam cerca de 90% das SN nos primeiros 3 meses de vida, e cerca de 2/3 dos casos de SN entre os 4 e 12 meses.

A SN congénita tipo finlandês, as mutações no gene NPHS2 (no cromossoma 19q13.1), que codifica a nefrina, são responsáveis pela maioria da SN congénitas.

Por outro lado, certos tipos HLA (-DR7, -B8, -B12) estão associados a incidência mais elevada de SN.

Manifestações clínicas e interpretação fisiopatológica

A apresentação clássica de um primeiro episódio de SN é a de uma criança com idade entre os 3 e os 9 anos com edema de início insidioso e com espectro que vai desde o edema palpebral (por vezes confundido com manifestação de quadro alérgico), a ascite, derrame pleural, até à anasarca, em associação com oligúria (urina habitualmente de aspecto espumoso.

A existência de hematúria macroscópica não é habitual na SNI, alertando para a eventualidade de trombose da veia renal ou de glomerulopatia crónica. A hematúria microscópica ocorre em 15% dos casos de lesões mínimas (LM).

Outras manifestações incluem hepatomegália e diarreia (por enteropatia exsudativa), dificuldade respiratória.

Nalguns doentes (cerca de 30%) há referência a infecções víricas ou bacterianas recentes, antecedendo o aparecimento daquele. O mesmo se verifica em 70% das recaídas.

A pressão arterial é, em regra, normal; somente cerca de 15% dos doentes registam uma hipertensão moderada. A existência de hipertensão (HTA) grave não é compatível com SN com lesões mínimas (LM).

A dor abdominal na criança com SNI é um sintoma de importância vital; as causas podem relacionar-se com: – peritonite primária por Streptococcus pneumoniae, ou E. coli; – com isquémia do território da mesentérica por hipovolémia grave; ou com trombose vascular.

O processo de trombose (designadamente tromboembolismo pulmonar podendo surgir em 15% dos casos) está relacionado com elevação do teor de factores/protrombóticos (fibrinogénio, plaquetas), hemoconcentração, acção de diuréticos, punções venosas, imobilização relativa, e diminuição de factores fibrinolíticos (perda urinária de antitrombina III, proteínas C e S).

Existe maior susceptibilidade para infecções (sobretudo por Streptococcus pneumoniae) explicável por disfunção imune dos linfócitos T e B, perda urinária de imunoglobulinas, complemento e properdina; daí o maior risco de peritonite primária (2-6%), celulite, pneumonia e sépsis.

A HTA e a hiperlipidémia comportam risco cardiovascular. A hipoproteinémia comporta risco de desnutrição e hipocrescimento.

Na SN genéticas (isoladas ou sindromáticas), a lesão estrutural justifica as suas características: início precoce (Quadro 1), falta de resposta ao tratamento e baixa recorrência ulterior ao transplante.

As manifestações são graves, comprometem a sobrevivência, necessitando na sua maioria de diálise durante o primeiro ano de evolução.

As SN genéticas sindromáticas caracterizam-se pela sua apresentação no contexto de patologia extrarrenal. São exemplo:

  • A síndroma de Denys-Drash, explicada por mutação no gene supressor de tumor de Wilms (WT1) do que resulta função anómala dos podócitos. Trata-se duma forma de SN de início precoce, com insuficiência renal progressiva, ambiguidade genital e tumor de Wilms;
  • A síndroma de Pierson, resultante de mutações no gene LAMB2 caracteriza-se por anomalias estruturais da beta 2-laminina, componente crítico das membranas basais ocular e glomerular. Apresenta-se como SN congénita e microcória (miose fixa por estreitamento da pupila).

A evolução para doença renal terminal é quase exclusiva da SN congénita e corticorresistente.

Exames complementares

No primeiro episódio de quadro sugestivo de SN, o doente deve ser hospitalizado para investigação, conduzindo aos diagnósticos sindrómico e etiológico, avaliar a resposta à terapêutica e esclarecer a família acerca da cronicidade da doença e das medidas de vigilância e controlo.

Ulteriormente poderá seguir-se o paciente em regime de ambulatório, de acordo com a clínica apresentada e com o meio familiar onde está inserida.

Nesta perspectiva, pressupondo anamnese e exame físico rigorosos, está indicada a realização de determinados exames complementares. (Quadros 2, 3 e 4)

QUADRO 2 – Anamnese

Doença actualAntecedentes pessoaisAntecedentes familiares
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Início dos sintomas. Início e características do edemaPeríodo pré/perinatalSN na família
Sinais e sintomas associados (hematúria, febre, oligúria, vómitos, dor abdominal, HTA, eritema cutâneo, artralgias…)Crescimento e desenvolvimentoOutras doenças renais na família
Viagens/infecções recentesDoenças sistémicas (autoimunes, neurológicas, metabólicas, congénitas, neoplasias)Outras doenças na família
Fármacos/toxinasInfecções 

QUADRO 3 – Exame físico

Parâmetros clínicosEdemaSinais e sintomas de hipovolémiaSinais e sintomas de infecção/doença sistémica

• Frequência cardíaca
• Frequência respiratória
• Pressão arterial
• Saturação em O2
• Peso corporal

• Peri-orbitário
• Pré-tibial
• Genital
• Ascite
• Edema da parede intestinal
• Derrame pleural
• Edema pulmonar
• Anasarca

• Dor abdominal
• Taquicardia
• Extremidades frias
• Oligúria
• TPC < 2 segundos

• Febre
• Eritema
• Púrpura
• Artrite

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QUADRO 4 – Exames analíticos

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AnálisesSangueUrina
Obrigatórias
    • Hemograma
    • Ureia e creatinina
    • Ionograma (incluindo cálcio ionizado)
    • Proteínas totais, albumina
    • Colesterol e triglicerídeos
    • PCR
    • Coagulação (incluindo antitrombina/AT III)
    • Imunoglobulinas
    • Complemento (C3, C4, CH50)
    • Análise sumária de urina (segunda amostra da manhã)
    • Proteinúria de 24 horas ou ratio proteinúria/creatininúria
Adicionais
    • Marcadores autoimunes (ANA, DS-DNA, ENA, ANCA)
    • Função tiroideia
    • Infecção/estudo serológico (rastreio de VHB, VHC, VIH, Parvovírus B19, CMV, VEB, Pneumococcus, Salmonella, Treponema, Mycoplasma...)
    • Sódio urinário

A análise de urina pode revelar hematúria microscópica em cerca de 20% dos casos de LM; a hematúria macroscópica, rara, deve orientar para outra afecção.

A relação proteína/creatinina urinária – UPr/UCr > 2,0 mg/mg – numa primeira amostra matinal, só por si, excluindo a proteinúria ortostática, é sugestiva de estar relacionada com SN. Valores entre 0,2 e 2,0 traduzem proteinúria ligeira a moderada.

O resultado do ionograma sérico é geralmente normal nos doentes com SN. Os níveis de cálcio podem estar baixos devido à hipoalbuminémia, embora os de cálcio ionizado estejam dentro dos limites da normalidade.

Adicionalmente, pode haver hiponatrémia, fundamentalmente por secreção inapropriada de hormona antidiurética (retenção de água e consequente hiponatrémia de diluição). A hiponatrémia pode também ser devida a causas iatrogénicas (uso de diuréticos para controlo do edema).

Os factores da coagulação, antitrombina III e plasminogénio estão diminuídos; o fibrinogénio e os factores I, II, V, VII, VIII, X e XIII estão aumentados.

O doseamento sérico das imunoglobulinas está também diminuído.

A creatinina sérica está geralmente normal; pode estar aumentada em situações de hipoperfusão renal resultante de contração do volume intravascular.

Os valores séricos de colesterol e triglicéridos estão elevados e os de C3, C4 e CH50 normais.

A radiografia do tórax está indicada se houver sintomatologia respiratória.

O Interferon Gamma Release Assay (IGRA), prova que permite rastrear a tuberculose, deve ser realizado antes do início da corticoterapia.

Na maior parte dos casos não é requerida a biópsia renal (BR). As indicações para tal procedimento são descritas no Quadro 5.

QUADRO 5 – Indicações da biópsia renal

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Antes do tratamentoApós tratamento
    • Início com menos de 12 meses ou mais de 12 anos de idade
    • Hematúria macroscópica inicial
    • HTA persistente e/ou hematúria microscópica e/ou diminuição do C3
    • SN secundária (a Púrpura de Henoch-Schoenlein, LES, etc.)
    • SN associada a síndromas
    • Insuficiência renal não relacionada com hipovolémia
    • Resistência aos corticóides
    • Algumas situações de corticodependência

Os achados histopatológicos através de biópsia renal percutânea permitem discriminar diversos padrões, os quais são descritos no capítulo sobre Doença glomerular (respectivo Quadro 2). Reitera-se aqui que o padrão de nefropatia de lesões mínimas (LM) é identificado na maioria dos casos (80 a 90%), seguindo-se os restantes padrões, por ordem decrescente: glomerulosclerose segmentar e focal (~10%), nefropatia membranoproliferativa, nefropatia membranosa e glomerulonefrite mesangial proliferativa (~5%).

O padrão de LM, não identificado por microscopia óptica, evidencia sinais de fusão dos podócitos na microscopia electrónica. O padrão de glomerulosclerose segmentar e focal, tal como o nome indica, traduz-se por imagens de alguns glomérulos sem alterações a par de áreas segmentares de esclerose ou cicatriz.

Estudos recentes sugerem um decréscimo da prevalência das lesões mínimas e um aumento dos casos de glomerulosclerose segmentar e focal.

O significado clínico dos subtipos histológicos da SNI não é linear. Na prática, independentemente do tipo histológico, o factor determinante do prognóstico é a resposta à corticoterapia. Contudo, a informação sobre o padrão histopatológico poderá ser valiosa em função do contexto clínico de cada caso.

O estudo genético deverá ser efetuado às crianças com SN Corticorresistente (SNCR), e na SN genética, isolada ou associada a outras síndromas (por ex. a já citada síndroma de Denys-Drash). (Quadro 6)

   QUADRO 6 – Genes associados a síndroma nefrótica

Abreviaturas: AR = autossómica recessiva; AD = autossómica dominante
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Gene

Hereditariedade

Forma clínica

NPHS1
NPHS2
CD2AP
PLCe1
TRPC6
PTPRO
WT1
LMX18

AR
AR
?
AR
AD
AR
Esporádica, AD
AR

SN Congénita/SN
SN Congénita, SN de início na infância e idade adulta
SN de início precoce
SN de início precoce
SN de início na idade adulta
SN de início na infância
Síndromas de Denys-Drash e Frasier.  SN de início na idade adulta
Síndroma da Unha-Patela/SN

SMARCALI
E2F3
NXF5

PAX2

ACTN4

MYH9

INF2

SYNPO

AR

Deleção cromossómica

Recessiva ligada ao X

AD

AD

Alelo de risco

AD

?

Displasia imuno-óssea de Schimke

SN de início precoce e atraso mental

SN com bloqueio cardíaco

SN de início na idade adulta

SN de início na idade adulta

SN de início na idade adulta

SN familiar/esporádica

SN de início na idade adulta

APOLI

MYO1E

ARHGAP24

ARHGDIA

ANLN

EMP2

CUBN

GPC5

Complexa/ AR

AR

AD

AR

AD

AR

AR

Alelo de risco

SN de início na idade adulta

SN de início precoce ou na idade adulta

SN de início na idade adulta

SN congénita

SN de início na idade adulta

SN de início na infância

Nefrite com proteinúria intermitente e epilepsia

SN de início na idade adulta

PODXL

TTC21B

CLTA4

MTTL1

tRNAIIe

tRNAAsn

tRNATyr

COQ2

AD

AR

Alelo de risco

?

?

?

?

AR

SN de início precoce ou na idade adulta

SN com envolvimento túbulo-intersticial

SN esporádica

Síndrome MELAS; SN +/- surdez e diabetes

Surdez, SN, Epilepsia e Cardiomiopatia dilatada

Falência multiorgânica e SN

Citopatia mitocondrial e SN

Doença mitocondrial/Nefropatia isolada

COQ6

ZMPSTE24

ADCK4

CYP11B2

LAMB2

ITGB4

AR

AR

AR

Alelo de risco

AR

AR

SN com surdez neurossensorial

Displasia mandíbulo-sacral com SN

SN

SN, Nefropatia IgA

Síndroma de Pierson; SN Congénita com anormalidades oculares;

SN de início precoce isolado

Síndroma NEP-SN, epidermólise bulhosa e doença pulmonar

Relativamente ao estudo genético, importa salientar que tem sido encontrado um número crescente de mutações em 66% dos doentes com SNC) e SNInf, e apenas em cerca de 16% com SNCR. Como nota prática importa reter que na síndroma nefrótica em que é identificada uma mutação genética, raramente se verifica resposta à corticoterapia ou à terapêutica imunossupressora.

Diagnóstico diferencial

A verificação de proteinúria, pressupondo devido enquadramento nos dados da anamnese e exame objectivo, obrigará ao diagnóstico diferencial com quatro situações:

  • Proteinúria transitória que se pode observar após exercício físico, febre, desidratação, convulsões e terapêutica com agonistas adrenérgicos. Não indicativa de doença renal, é ligeira (UPr/Cr < 1) e de natureza glomerular;
  • Proteinúria postural (ortostática), situação benigna definida por excreção normal de proteínas quando em posição de decúbito, e elevada quando há mobilização corporal e posição bípede;
  • Proteinúria tubular, caracterizada por predomínio excretório de proteínas de baixo peso molecular, está associada tipicamente a situações como necrose tubular aguda, pielonefrite, nefropatias estruturais, doença renal poliquística, toxicidade por antibióticos e por agentes quimioterapêuticos. A combinação de proteinúria tubular com glicosúria e perda tubular de electrólitos integra a síndroma de Fanconi;
  • Proteinúria glomerular, muitas vezes traduzindo doença glomerular (hematúria, eritrocitúria, HTA, insuficiência renal), caracteriza-se por proteinúria de grau variável e de peso molecular variável; constituem exemplos a síndroma hemolítica urémica e a glomerulonefrite pós-estreptocócica.

Evolução

Depois do primeiro episódio, em cerca de 90% dos pacientes surgem recaídas.

O grau de recorrência, a resposta ao tratamento e os achados histopatológicos determinam diversas categorias de SN contribuindo para estabelecer o prognóstico.

O Quadro 7 discrimina as diversas modalidades de evolução possível.

No Quadro 8 é estabelecida a classificação das diversas formas de SN em função da resposta ao tratamento com corticóides.

QUADRO 7  – Conceitos de evolução clínica

Remissão: ausência de proteinúria (< 4 mg/m2/h ou relação urinária Proteína/Creatinina < 0,2) ou tira-teste urinária negativa/vestígios durante 3 dias consecutivos
Remissão parcial: normalização da albuminemia (>3g/L) com persistência de proteinúria não nefrótica (4-40mg/m2/h)
Remissão completa: ausência de proteinúria e normalização de albuminemia após 7-10 anos sem recaídas
Recaída: aparecimento de proteinúria em fita-teste urinária (≥ 3+) durante 3 de 5 dias consecutivos em qualquer altura da evolução
Resistência: persistência de proteinúria nefrótica apesar do tratamento
 

QUADRO 8 – Classificação de acordo com a resposta ao tratamento com corticoides

SN corticossensível: quando a resposta ao tratamento inicial com prednisolona é a remissão completa da síndroma 

    • Recaídas frequentes: doentes corticossensíveis com 2 ou mais recaídas nos 6 meses após manifestação inicial ou ≥ 4 recaídas em qualquer período de 12 meses
    • Recaídas pouco frequentes: doentes corticossensíveis com 1-3 recaídas por ano
    • Corticodependentes: doentes corticossensíveis que apresentam recaída durante o período em que está a decorrer a diminuição progressiva da dose de prednisolona, ou nas 2 semanas seguintes à supressão do tratamento

SN Corticorresistente: persistência da síndroma clínica e/ou bioquímica após 4 semanas de administração diária de prednisolona – 60 mg/m2/dia, per os, ou após bolus ev de metilprednisolona – 30 mg/kg, em dias alternados, até um máximo de 3 bolus.

Tratamento e medidas preventivas

O tratamento engloba duas vertentes: farmacológica e medidas gerais.

Os corticóides, a base principal do tratamento farmacológico, são citados em primeiro lugar.

Tratamento farmacológico

1. Corticóides

Os corticóides são os fármacos de eleição para induzir a remissão nos casos de SN não complicada entre os 1-12 anos pela probabilidade de se tratar de forma clínica associada a padrão de LM.

A medicação “tipo” para o tratamento da SN é a prednisona ou o seu metabólito activo, a prednisolona. Apesar de, em termos de biodisponibilidade, tais fármacos não serem equivalentes, têm sido usados indiferentemente na mesma dosagem, quer na prática clínica, quer em ensaios controlados e aleatorizados. Sobre outros corticóides (deflazacort, dexametasona, betametasona, metilprednisolona), que também têm sido utilizados para tratamento inicial da SN, não há estudos que demonstrem a sua eficácia.

1.1 SN supostamente associada a LM

Após verificação da negatividade do IGRA, é iniciada administração de prednisolona 60 mg/m2/dia, em dose única matinal ou em duas doses diárias, durante 4-6 semanas (dose máxima diária, 60 mg).

Cerca de 80-90% dos doentes respondem à corticoterapia com remissão até ao fim de 3 semanas. É importante salientar que o aumento acentuado da diurese poderá originar hipovolémia e aumentar o risco de trombose.

Após este curso terapêutico de 4 a 6 semanas, a prednisolona é diminuída para 40 mg/m2 em dias alternados, dose única matinal, ou em duas doses diárias no dia do tratamento, durante pelo menos 4 semanas, procedendo-se ulteriormente, à diminuição gradual até à interrupção (redução de aproximadamente 15 mg/m2 cada 10-15 dias).

Diversos estudos demonstraram que doses mais elevadas e maior duração da terapêutica prolongada ou repetida com corticóides reduzem o risco de recaídas (de 60-80% para 30-40%). Há, no entanto, necessidade de uma monitorização dos efeitos secundários da corticoterapia (restrição do crescimento, obesidade, osteoporose, catarata, alterações psicológicas, etc.).

1.2 Recaídas de SN

Nas recaídas, a indução da remissão é alcançada com prednisolona na dose de 60 mg/m2/dia – tal como no episódio inaugural, passando-se à administração em dias alternados de prednisolona, que é diminuída para 40 mg/m2 (máximo 60 mg) logo que a proteinúria seja negativa durante 3 dias consecutivos. O tratamento em dias alternados mantém-se mais 4 semanas, após o que se inicia a redução gradual até à interrupção, tal como foi referido a propósito da terapêutica inicial.

2. Imunossupressores

Como regra geral pode estabelecer-se que os doentes portadores de SN com recaídas frequentes, SN corticodependente e SN corticorresistente são candidatos a outras terapêuticas alternativas, particularmente se existirem efeitos acessórios significativos relacionados com a corticoterapia.

Nesta perspectiva, têm sido utilizados imunossupressores com diversos mecanismos de acção, e resultados variáveis quanto a eficácia e toxicidade: ciclofosfamida, clorambucil, levamisol, azatioprina, anticalcineurínicos (ciclosporina A e tacrolimus), micofenolato mofetil, mizoribina e rituximab.

Os fármacos com melhor perfil de segurança são a ciclofosfamida, o micofenolato mofetil e os anticalcineurínicos.

2.1 SN corticodependente

O objectivo é diminuir o número de recaídas, prolongar o período de remissão e reduzir a toxicidade.

  • A ciclofosfamida é o fármaco de eleição para a SN corticodependente (2 mg/kg/dia, per os, durante 8 a 12 semanas), devendo administrar-se apenas em 1 ciclo. É gonadotóxica e pode originar cistite hemorrágica e leucopénia. Não é nefrotóxica.
  • O micofenolato mofetil (400-600 mg/m2 de 12-12 horas) é a segunda alternativa, durante 1 ano, com redução progressiva no período de 3-6 meses; tem as vantagens de não ser nefrotóxico nem gonadotóxico, embora possa originar mielossupressão. Obriga a doseamento sérico (2-5 ng/mL).

Os anticalcineurínicos (ciclosporina A ou tacrolimus), o levamisol e o rituximab reservam-se para terceira prioridade considerando os seus efeitos secundários, designadamente, nefrotóxicos:

  • Ciclosporina A (5-6 mg/kg/dia durante 6-12 meses, com ulterior redução gradual lenta); potencialmente nefrotóxica, obriga a doseamento sérico (75-150 ng/mL); menos eficaz se existir hipercolesterolémia grave;
  • Tacrolimus (0,15 mg/kg/dia durante 6-12 meses), com ulterior redução gradual. Como inconvenientes citam-se o risco de diabetes e a nefrotoxicidade; obriga a doseamento sérico (5-10 ng/mL);
  • Levamisol (2,5 mg/kg em dias alternados, três dias por semana durante um ano), também em conjunto com prednisolona em dose mínima;
  • Rituximab (375 mg/m2/semana – máximo 4 doses, por via ev) reservado para casos seleccionados, com elevado grau de dependência; risco de fibrose pulmonar e de toxicidade em subpopulações linfocitárias.

Durante o tratamento deve proceder-se a avaliação analítica (designadamente através do hemograma e das provas de função hepática), pelo menos de 3 em 3 meses. Uma parte significativa dos doentes recidiva depois da suspensão deste tratamento.

Nota: 1) Nalguns doentes a remissão mantém-se com as doses baixas de prednisolona em dias alternados referidas em 1.2 – (40 mg/m2 – máximo 60 mg) – durante 1-2 anos. 2) A resposta à ciclofosfamida é melhor se tiver havido boa resposta à corticoterapia. 3) Assim, é recomendável iniciar a ciclofosfamida depois de induzida a remissão com a prednisolona, mantida em dose mínima durante o tempo de ciclofosfamida, o que poupa o doente aos efeitos acessórios dos corticóides.

2.2 SN corticorresistente

Salientando-se que não existe consenso em relação aos esquemas terapêuticos utilizados nas situações de corticorresistência, o objectivo geral é conseguir remissão completa ou parcial para reverter ou minorar o risco de insuficiência renal.

Os inibidores da calcineurina (ciclosporina ou tacrolimus) utilizam-se em primeira linha. A ciclosporina A tem sido utilizada de modo mais amplo. Os estudos demonstraram que o tacrolimus é tão eficaz como a ciclosporina, evidenciando menores efeitos secundários. Os pacientes devem, de facto, ser vigiados quanto aos referidos efeitos, incluindo HTA, hirsutismo, nefrotoxicidade e hiperplasia gengival.

Na maioria dos casos verifica-se resposta após período de 3-6 meses de tratamento, recomendando-se biópsia renal para valorizar a nefrotoxicidade.

A opção seguinte será o micofenolato mofetil em monoterapia; ou associado: – a prednisona; – ou a inibidor da calcineurina.

Na actualidade, a experiência com rituximab está limitada a casos isolados, embora com resultados prometedores. Recentemente foi descrito o papel de outro anticorpo monoclonal anti CD20 chamado ofatumumab.

2.3 SN genética

A decisão de tratamento imunossupressor em tal circunstância deve ser individualizada e cautelosa, designadamente em função do modo de apresentação clínica, tipo e gravidade da mutação, a condição de homo ou heterozigotia.

Medidas gerais

1. Hipovolémia

Nos casos de hipovolémia (hemoconcentração, taquicardia, hipotensão, dor abdominal, hematócrito e ureia elevados), a correção é feita com soro fisiológico e albumina a 20% endovenosa (1 g/kg, durante 4 horas); é necessário proceder à monitorização das frequências respiratória e cardíaca, e da pressão arterial.

Nas situações mais graves, com choque hipovolémico, poderá estar indicada a perfusão de albumina a 4% (1 g/kg).

2. Diuréticos

Torna-se importante estimar qual a contribuição dos mecanismos de contracção vascular e de expansão vascular (ver atrás) em cada doente antes da utilização de diuréticos.

O tratamento com diuréticos é eficaz nas situações de expansão vascular, enquanto nos doentes com contração vascular esta terapêutica agrava a hipovolémia já existente.

Na prática, os diuréticos de ansa (furosemido) estão indicados em caso de edema grave, depois da correção da hipovolémia; devem ser usados com precaução pelos riscos de agravamento da depleção do volume intravascular, de tromboembolismo, de insuficiência renal aguda e de alterações graves do balanço hidroelectrolítico.

3. Regime alimentar

Durante o tratamento com corticóides deve ter-se em atenção, particularmente, o sal, os hidratos de carbono e os produtos lácteos. Na fase aguda, a restrição de sal está indicada na prevenção e tratamento do edema. A ingestão salina não deve exceder os 35 mg/kg/dia de NaCl.

A ingestão proteica diária deverá ser a adequada ao peso e idade, ~1-2 g/kg/dia.

Perante situação de dislipoproteinémia, o suprimento em gorduras deve ser limitado a < 30% do valor calórico total, e a < 300 mg/dia de colesterol. No contexto de SN, não há dados suficientes para a recomendação de estatinas nos casos de disliproteinémia acentuada.

4. Protecção gástrica

A incidência de úlcera gástrica em doentes sob corticoterapia é muito baixa, especialmente nas crianças, pelo que a profilaxia da úlcera gástrica com inibidores da bomba de protões, não está indicada. A profilaxia deverá ser reservada para os casos em que o tratamento é prolongado, ou associado à utilização de outros anti-inflamatórios (por ex. ácido acetilsalicílico).

5. Recomendação de imunizações

Regra geral, o calendário vacinal deve ser respeitado, embora nos casos de recaídas frequentes possa haver necessidade de o adiar.

Se possível, os doentes devem receber as vacinas recomendadas, pelo menos 2 semanas antes do início do tratamento com corticóides. As vacinas vivas não devem ser administradas durante o tratamento com corticóides em altas doses; somente, pelo menos quatro semanas após o seu término. Considera-se corticoterapia em altas doses, a dose de, pelo menos, 20 mg/dia de prednisona (ou de dose equivalente de outro corticóide) durante um período de, pelo menos, 2 semanas.

A varicela num doente imunodeprimido é uma doença grave. Em caso de exposição do doente com SN a caso da varicela, está indicada a prevenção com aciclovir. Na mesma circunstância, nos casos de recaídas, deve administrar-se imunoglobulina varicela-zóster dentro de 72 horas após exposição.

Nas crianças não imunes contra a varicela (títulos serológicos negativos) está indicada a vacina antivaricela na fase de remissão, ou na fase de corticoterapia com doses baixas em dias alternados.

Recomenda-se igualmente a vacina antipneumocócica polissacarídea para 23 estirpes a todas as crianças acima dos 2 anos. Esta vacina deve ser administrada pelo menos 8 semanas após a última administração da vacina antipneumocócica conjugada para 13 estirpes, e repetida a cada 5 anos, se a SN se mantiver.

Está igualmente indicada a vacinas antigripe anualmente.

Complicações

Os doentes com síndroma nefrótica comportam risco elevado de complicações, discriminadas a seguir.

Tromboembolismo

O tromboembolismo nestes doentes é multifactorial. Para além dos factores de risco hereditários que podem existir (tal como a mutação do fator V de Leiden), verifica-se deplecção intravascular, que pode ser agravada pelo uso de diuréticos para controlo do edema. Há também perda urinária de factores da coagulação (antitrombina III) e um aumento de produção hepática de factores procoagulantes (fibrinogénio, factor V e factor VIII), o que favorece a formação de trombos. A hiperlipidémia, a trombocitose e a agregação das plaquetas poderão ter também um papel relevante na génese da trombose.

A incidência destes fenómenos é desconhecida, embora haja descrições que apontam para uma incidência na ordem dos 1,8 a 4,4% nas crianças com SN Idiopática, sendo muito mais elevada nas crianças com SN secundária a nefropatia membranosa ou membranoproliferativa. As taxas mais elevadas ocorrem nas crianças com SN congénita.

A trombose cerebral é a forma clínica mais frequentemente observada (particularmente a trombose do seio sagital), seguindo-se, em proporção decrescente, o tromboembolismo pulmonar e a trombose venosa profunda dos membros inferiores.

A trombose da veia renal caracteriza-se clinicamente pelo aparecimento de dor súbita no flanco, acompanhada por episódio de macro-hematúria.

A anticoagulação profiláctica não é recomendada, excepto nos casos de evento tromboembólico prévio.

Infecção

Na SN há também perda urinária de imunoglobulinas. Esta perda de anticorpos circulantes coloca o paciente em risco de desenvolvimento de infecções bacterianas, particularmente secundárias a agentes bacterianos capsulados (por ex. Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae, e Streptococcus do grupo B).

A peritonite causada por S. pneumoniae é uma infecção “clássica”, bem conhecida, em crianças com SN. Outras patologias possíveis com a tal etiologia são incluem celulite, pneumonia ou sépsis.

Por outro lado, há que ter em consideração a influência do efeito do tratamento imunossupressor na etiopatogénese das infecções, em geral.

Dislipidémia

A hipoalbuminémia estimula a síntese de colesterol-LDL e de triglicerídeos, explicando a dislipoproteinémia.

A hipercolesterolémia resulta de uma variedade de factores, salientando-se o aumento da actividade da enzima β-hidroxi-β-metilglutaril-coenzima A (responsável pela síntese do colesterol), e o decréscimo da actividade da 7α-hidroxilase (enzima responsável pelo catabolismo do colesterol). Daí, a elevação do colesterol total e do colesterol-LDL.

A hipertrigliceridémia é o resultado da diminuição da conversão dos triglicerídeos em ácidos gordos livres, devido à presença de uma glicoproteína semelhante à angiopoietina. Esta glicoproteína, encontrando-se em vários tecidos, é produzida em resposta à proteinúria nefrótica.

Lesão renal aguda

A insuficiência renal aguda pode ocorrer durante o curso da SN, especialmente em doentes que se apresentem com hipovolémia. O uso agressivo de diuréticos, doença pré-existente, ou sépsis com hipotensão, podem diminuir o volume intravascular, causando uma diminuição na taxa de filtração glomerular. Esta lesão renal aguda é, na maioria dos casos, reversível com uma adequada replecção do volume intravascular, medida já citada anteriormente.

Lesão óssea e hipotiroidismo

Para além das perdas urinárias de albumina e imunoglobulinas, a SN também causa perda de outras importantes proteínas, incluindo a proteína de ligação à vitamina D e a proteína de ligação à hormona tiroideia. Estas perdas podem originar deficiência de vitamina D e aumentar a probabilidade de doença óssea.

O hipotiroidismo é um problema mais frequente nos doentes com proteinúria maciça de longa duração. Contudo, os doentes com recaídas frequentes devem também ser rastreados para este problema.

Prognóstico

O prognóstico da SN Idiopática é, de um modo geral, bom. As recaídas nos casos que respondem aos corticóides (SN corticossensíveis) têm tendência a diminuir com o decorrer do tempo. O prognóstico é mais favorável nos casos com resposta rápida aos corticóides e sem ocorrência de recaídas nos 6 meses após o diagnóstico.

Por outro lado, o prognóstico é reservado em cerca de 10% dos casos (padrão histológico de glomerulosclerose focal e segmentar).

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