Definição e importância do problema

A dor é definida como uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a lesão tecidual. Trata-se, pois, dum fenómeno subjectivo demonstrável no RN, já a partir das 24 semanas de gestação; efectivamente, os elementos do SNC necessários para a transmissão do estímulo doloroso ao córtex cerebral estão presentes desde aquela idade gestacional, conquanto a maturação funcional e estrutural do sistema neurossensorial progrida durante a vida pós-natal.

O reflexo doloroso característico do primeiro trimestre é exagerado e hipersensível, devido a proliferação e diferenciação das células nervosas e ao aumento do número de receptores. Esta situação mantém-se até o início do período neonatal. Neste período, a resposta ao estímulo doloroso torna-se mais específica e localizada devido ao desenvolvimento, da actividade neural, factores tróficos, marcadores e formação de sinapses específicas.

O desenvolvimento cognitivo é determinante na reacção ao estímulo doloroso o que significa que, em cada faixa etária, a reação à dor pode variar. Apesar da existência de recursos relativamente reduzidos para a analgesia no período neonatal, existem alternativas seguras e eficazes para o tratamento doloroso neste grupo etário. Salienta-se que a indicação da analgesia deverá ser individualizada e sempre considerada em recém-nascidos portadores de doença potencialmente dolorosa e/ou submetidos a cirurgia ou manobras invasivas.

De acordo com estudos epidemiológicos, em média, cada RN hospitalizado em UCIN é sujeito a cerca de 8-10 procedimentos dolorosos por dia nas primeiras semanas de vida; no caso dos RNMBP tal acontece cerca de 500 ou mais vezes durante o respectivo internamento. Entre as múltiplas “agressões” associadas aos cuidados contam-se estímulos intensos auditivos, visuais, tácteis/manuseamentos intempestivos, punções, entubações, ventilação mecânica e aspiração de secreções. Nos doentes do foro cirúrgico assume importância a dor provocada por manobras cruentas ao nível de vários territórios.

Nesta perspectiva, em todas as unidades neonatais existe a preocupação de reduzir ao mínimo a dor, a qual se exprime de modo peculiar no RN.

Cabe referir, a propósito do combate à dor (analgesia ou conjunto de medidas que suprimem ou atenuam a dor) que por vezes o mesmo é utilizado em associação a outro tipo de medida (sedação ou conjunto de medidas de acalmia); o objectivo final é, minorando o estresse, proporcionar o máximo de bem-estar à criança, o que tem repercussões funcionais positivas ao nível de diversos órgãos e sistemas.

Etiopatogénese

Face a estímulo doloroso, o RN apresenta uma resposta global de estresse traduzida por alterações de tipo cardiovascular, respiratório, imunológico, hormoral, metabólico e comportamental.

Com efeito, a dor activa determinados mecanismos compensatórios do sistema nervoso autónomo. As alterações fisiopatológicas resultantes da percepção de dor (nocicepção) podem ser sistematizadas do seguinte modo: taquicárdia, elevação da pressão arterial sobretudo à custa da pressão sistólica, taquipneia ou bradipneia/apneia, variação da pressão intracraniana, hipoxémia, hipercápnia, libertação de mediadores como renina, endorfinas, catecolaminas, e cortisol ou seus precursores.Verifica-se igualmente catabolismo proteico, consumo de gorduras e hiperglicémia. Embora a especificidade e a sensibilidade destes “indicadores” variem muito, tais sinais e fenómenos são de fácil aplicação e estão disponíveis nas unidades de cuidades intensivos neonatais.

O estímulo doloroso prolongado pode ter consequências a médio prazo, tais como hemorragia intracraniana e leucomalácia periventricular. A longo prazo, demonstrou-se que o referido estímulo poderá ter repercussão sobre a estrutura (neurónios e sinapses) do próprio sistema nervoso central. Torna-se assim compreensível que o manejo inadequado do estresse num recém-nascido seja susceptível de ter impacte negativo na criança, predispondo no futuro a problemas de ordem cognitiva e comportamental.

Avaliação da dor

A avaliação e medição da dor na criança que não possui linguagem falada coloca problemas complexos pela dificuldade na concepção de um instrumento sensível e válido, e de fácil aplicação na prática clínica.

Em complemento do que foi referido antes, cumpre salientar os parâmetros fisiológicos que podem ser “medidos” para avaliar ou “objectivar” a dor, com a noção de que se trata de medidas fisiológicas objectivas, mas pouco específicas: frequência cardíaca (elevação), frequência respiratória (maior variabilidade, elevação ou apneia), pressão arterial sistólica (elevação), sudorese palmar (aumento), pressão transcutânea ou saturação transcutânea em O2 (diminuição) e hormonas de estresse.

De facto, podem ser obtidas reacções ou sinais orgânicos similares como resultado de estímulos desagradáveis (de desconforto), mas não dolorosos. Por outro lado, a avaliação da dor no RN pré-termo e no RN em estado crítico levanta problemas particulares, pois as manifestações encontradas poderão corresponder às manifestações da própria doença de base, sendo a dificuldade maior nos casos de disfunção cerebral.

A avaliação comportamental baseia-se na modificação de determinadas expressões comportamentais desencadeadas pelo estímulo doloroso; as que têm sido mais estudadas são: a resposta motora à dor (alterações do tono e movimentos do corpo), mímica facial, choro e padrão de sono-vigília.

O choro, considerado o método primário de comunicação dos recém-nascidos (RN), é por isso pouco específico; nos casos dos recém-nascidos de extremo baixo peso, na maioria das vezes entubados, tal dado não poderá ser avaliado.

A actividade motora isolada parece ser um método sensível, pois os RN pré-termo e de termo evidenciam classicamente um repertório organizado de movimentos após a estimulação sensorial.

A expressão facial fornece informações válidas, específicas e sensíveis sobre a intensidade da dor e permite uma comunicação eficaz entre o RN e os respectivos prestadores de cuidados.

Em comparação com os parâmetros fisiológicos, os parâmetros comportamentais são mais específicos, embora menos objectivos, dependendo da interpretação de cada observador.

Na prática clínica são utilizadas as chamadas escalas (ou valorização de modo estruturado de determinados parâmetros fisiológicos ou comportamentais), atribuindo-se pontuação aos referidos parâmetros; assim, é possível chegar-se a pontução total ou somatório dos pontos atribuídos a cada parâmetro isoladamente.

Tendo como base tal critério, a avaliação da dor poderá ser feita de modo sistematizado pela equipa assistencial, designadamente nas seguintes circunstâncias:

  • Procedimentos cirúrgicos;
  • Manobras invasivas;
  • RN submetidos a ventilação mecânica;
  • RN com lesões traumáticas, incluindo traumatismos de nascimento;
  • RN com enterocolite necrosante;
  • Queimaduras da pele;
  • Abrasão causada por sensores transcutâneos, monitores ou dispositivos de contacto.

Entre várias escalas, cabe salientar quatro, de aplicação relativamente fácil:

  • NFCS (Neonatal Facial Coding Scale) ou escala de avaliação da mímica facial – presença ou ausência de 8 parâmetros observáveis na fronte e face (Quadro 1);
  • NIPS (Neonatal Infant Pain Scale) ou escala de avaliação da dor para recém-nascidos – englobando presença ou ausência de parâmetros comportamentais e fisiológicos de dor (Quadro 2);
  • CRIES (Crying, Requiring O2 for saturation > 90%, Increased vital signs, Expression, and Sleeplessness), escala utilizada para a avaliação da dor pós-operatória de RN (Quadro 3);
  • PIPP (Premature Infant Pain Profile), a escala mais adequada para avaliação da dor em RN pré-termo (Quadro 4).

A escala CRIES integra cinco parâmetros; a cada um é atribuída a pontuação de 0 a 2, obtendo-se a pontuação máxima de 10. A determinação faz-se cada 2 a 4 horas no período de 48 horas após intervenção cirúrgica. Se a pontuação for igual ou superior a 5, está indicada analgesia.

Como limitações há referir, por exemplo, a dificuldade de avaliação do choro e da mímica facial em doentes submetidos a ventilação mecânica.

A escala de PIPP é a mais indicada para avaliação da dor neste grupo etário por considerar as alterações próprias desta faixa de pacientes. Salienta-se que a mesma foi validada quanto à sua aplicabilidade em situações de pós-operatório.

QUADRO 1 – NFCS (Neonatal Facial Coding Scale).

Se a pontuação for superior a 3 está indicada analgesia
Parâmetro Pontuação 0
(ausência)
Pontuação 1
(presença)
Fronte saliente  
Pálpebras contraídas  
Sulco nasolabial mais acentuado  
Lábios entreabertos  
Boca esticada/protusão labial  
Lábios franzidos  
Língua tensa  
Tremor do mento  

QUADRO 2 – NIPS (Neonatal Infant Pain Scale).

Se a pontuação for superior a 3 está indicada analgesia
ParâmetroPontuação 0Pontuação 1Pontuação 2
Estado de alertaA dormir e/ou calmoDesconfortável e/ou calmo
Membros superioresRelaxadosFlectidos/estendidos
Membros inferioresRelaxadosFlectidos/estendidos
RespiraçãoRegularIrregular
ChoroAusenteQueixosoVigoroso
Expressão facialRelaxadaContraída

QUADRO 3 – CRIES (Escala de avaliação da dor no pós-operatório).

Parâmetro                                    Pontuação (0), (1), (2)
Choro → Ausente (0), Forte (1), Inconsolável (2)
FiO2 para SpO2 > 90% → 21% (0), 21-30% (1), > 30% (2)
FC e PA → Não > FC e PA (0), Até > 20% FC ou PA (1), >20% FC ou PA
Mímica facial → Relaxada (0), Careta esporádica (1), Contraída (2)
Sono/vigília → Normal (0), Intervalos curtos (1), Ausente (2)
PA=pressão arterial; FC=frequência cardíaca
Se pontuação 5 está indicada analgesia

QUADRO 4 – Escala do perfil de dor, do recém-nascido prematuro (PIPP).

Pontuação igual ou inferior a 6 →  indica ausência de dor; entre 6 e 11 → indica dor leve;  se superior ou igual a 12 → dor moderada a intensa.

PIPPIndicadores0123
 IG (semanas)36 ≥ semanas  e 6 dias32 a 35 semanas e 6 dias28 a 31 semanas e 6 dias< 28 semanas
Observar RN por um período 15mEstado de alerta Activo
Acordado
Olhos abertos
Movimentos faciais presentes
Quieto
Acordado
Olhos abertos
Sem mímica
Activo
Dormindo
Olhos fechados
Movimentos faciais presentes
Quieto
Dormindo
Olhos fechados
Sem mímica facial
Registar FC e Sat. em O2 (SpO2)
(% ou grau de diminuição)
FC máxima
Saturação mínima
↑0 a 4 bpm
↓ 0 a 2,9%
↑ 5 a 14 bpm
↓ 2,5 a 4,9%
↑15 a 24
↓5 a 7,4%
↑≥ 25 bpm
↓≥ 7,5 %
Observar o RN por 30 segundosTesta  franzida
Olhos “espremidos”
Sulco naso labial
Ausente
(0-9% do tempo de observação)
Ausente
Ausente
Mínima
(10 a 39% do tempo de observação)
Mínimo
Mínimo
Moderado
(40 a- 69% do tempo de observação)
Moderado
Moderado
Máximo
(+ de 70% do tempo de observação)
Máximo
Máximo

Actualmente é possível a utilização de tecnologia (algesímetro) que permite, de modo objectivo, medir quantitativamente as alterações fisiopatológicas resultantes do estímulo doloroso (resposta nociceptiva atrás referida) com base nas propriedades de condutância da pele. Em Portugal este tópico foi investigado por L. Pereira-da-Silva na UCIN do Hospital Dona Estefânia.

Prevenção

A prevenção da dor no RN passa pela aplicação dum conjunto de medidas que promovem o conforto e reduzem o estresse, tais como: diminuir o ruído (alarmes, diálogos, etc.), assim como a incidência da luz intensa, (protecção das incubadoras com cobertor, utilização de luz com focos de intensidade variável, etc.), manutenção de ciclos de sono dia/noite preservando períodos livres para o contacto com os pais. Nesta perspectiva, o balanceio e o uso de colchões de água poderão contribuir para regular o estado de alerta e diminuir o estresse.

Outras medidas incluem manipulação mínima, boa gestão dos cuidados concentrando determinados procedimentos para a mesma hora no sentido de evitar estimulação excessivamente frequente do RN (colheitas de sangue, aspiração traqueal, posição confortável em flexão sempre que possível utilização dos chamados “ninhos ou lençóis /fraldas enrolados em torno do corpo, etc.) e reduzir ao mínimo indispensável a utilização de fitas adesivas sobre a pele.

Tratamento

Para o alívio ou inibição da dor (analgesia), podem ser utilizadas medidas não farmacológicas e medidas farmacológicas.

A dor também pode ser aliviada ou inibida através da diminuição ou extinção da sensibilidade dolorosa em determinada região do organismo; é o conceito de anestesia local, que se pode considerar uma forma de analgesia. A este propósito, é importante realçar que o conceito de que a “infiltração com fins anestésicos é tão dolorosa quanto a própria agulha utilizada como procedimento com fins terapêuticos” não parece ser verdadeira de acordo com os resultados de estudos científicos.

Os anestésicos tópicos actuam por bloqueio dos canais de sódio nas terminações nervosas nociceptivas responsáveis pela condução do estímulo doloroso à medula-espinhal.

Medidas analgésicas não farmacológicas

  • Contacto pele com pele
    Esta medida, preconizada em RN aparentemente saudáveis necessitando de procedimento que provoca dor (como por ex. punção capilar, punção venosa, injecção IM, etc.) pode ser concretizada pelo contacto físico mãe-filho durante a realização daquele.
  • Amamentação
    Colocando o lactente ao peito, verifica-se alívio da dor enquanto se realiza o procedimento. Estudos interessantes demonstraram, com efeito, que a amamentação bloqueia impulsos aferentes ao nível da medula-espinhal e, ao mesmo tempo, estimula a libertação de endorfinas.
  • Sucção não nutricional
    Em função do contexto clínico poderá utilizar-se esta medida através de colocação de chupeta na boca; demonstrou-se, com efeito, que durante os movimentos rítmicos de sucção se atenua a dor, a qual retorna quando há interrupção da sucção.
  • Solução de sacarose
    As soluções ligeiramente doces têm efeito analgésico demonstrado em diversos estudos; na prática utiliza-se solução de sacarose a 24% (24 gramas de sacarose/100 mL de água) na dose de 0,05 a 1,5 mL colocada na porção anterior da língua cerca de 2 minutos antes do procedimento a realizar (punções, aplicação de linhas IV, etc.).

Medidas analgésicas farmacológicas (gerais)

No âmbito das medidas farmacológicas podem ser utilizados fundamentalmente dois tipos de fármacos: analgésicos não opióides e analgésicos opióides. São referidos os mais frequentemente utilizados em Portugal.

Analgésicos não opióides

*Paracetamol

No período neonatal, dentro deste grupo de fármacos, emprega-se quase invariavelmente o paracetamol, o analgésico não opióide mais investigado e mais seguro no período neonatal.

As doses a utilizar são:

  • No RN de termo (10-15 mg/kg/dose cada 6 ou 8 horas);
  • No RN pré-termo (10 mg/kg/dose cada 8 ou 12 horas).

O início de acção é lento, cerca de 1 hora, pouco efectivo para processos muito dolorosos. Deve ser administrado por via oral, sendo que a absorção rectal é irregular (dose rectal: ~ 15-25 mg/kg cada 8 ou 12 horas). Poderá utilizar-se a via parentérica IV, sendo útil como coadjuvante na analgesia pós-operatória, por não interferir na agregação plaquetar. O paracetamol está contraindicado nos casos de crianças com défice enzimático eritrocitário de G-6PD (desidrogenase da glucose -6 fosfato); apesar da sua hepatotoxicidade, ela é baixa nesta faixa etária.

Analgésicos opióides

Nos RN submetidos a terapia intensiva são utilizados com maior frequência estes fármacos, os quais constituem a mais importante arma de analgesia. O fundamento da sua acção baseia-se no facto de existirem receptores opióides dispersos no SNC; tais receptores, uma vez activados, inibem a transmissão do estímulo doloroso aos centros superiores.

*Morfina

Potente analgésico e um eficaz sedativo, a morfina pode ser utilizada através das vias IV, SC ou IM. Em bólus a dose a aplicar é: 0,05-0,15 mg/kg/dose IV em 5 minutos; ou em alternativa, a mesma dose por via IM ou SC. Pode ser repetida após 4 horas.

Em perfusão contínua IV:

      • RN de termo à 5-10 mcg/kg/hora (se dor moderada) ou à 10-20 mcg/kg/hora (se dor intensa);
      • RN pré-termo à 2-5 mcg/kg/hora (se dor moderada) ou à 5-10 mcg/kg/hora (se dor intensa);
      • RN acordado e sem ventilação mecânica, poderá utilizar-se a dose de infusão contínua de 3 a 8 mcg/kg/hora.

Como efeitos colaterais (frequentes em todos os opióides) citam-se: depressão respiratória, íleo paralítico, náuseas, vómitos, retenção vesical, hipersudorese, etc..

Tendo em conta a libertação de histamina que provoca, pode surgir broncospasmo, facto a ter em consideração nos doentes com DBP.

Pela supressão do tono adrenérgico que origina, poderá surgir hipotensão arterial. Para combater a depressão respiratória emprega-se o antagonista naloxona, que é um agente antagonista não selectivo de opióides, extremamente potente. Como possui uma semivida curta, a maioria dos pacientes poderá necessitar de doses repetidas.

Nos casos de tratamento com morfina poderá verificar-se fenómeno de tolerância e, consequentemente, ulterior síndroma de abstinência aguda (convulsões, hipertensão, alterações do foro digestivo, entre outras manifestações). Tal poderá evitar-se, em certa medida, procedendo à redução gradual da dose (diariamente, cerca de 25-50% da dose previamente instituída).

Caso se comprove tal síndroma, está indicado o emprego de naloxona como antagonista efectivo da morfina (embora contraindicada nos lactentes de mãe toxicodependente e nos submetidos a tratamento com morfina durante mais de 6 dias), salientando-se que o período em que poderá ser utilizado em segurança para reversão da síndroma de abstinência é curto (apenas dentro do período < 6 dias de tratamento prévio com morfina).

*Fentanil

Em bólus a dose a aplicar é 1-3 mcg/kg/dose IV, cada 2 a 4 horas.

Em perfusão contínua IV (de preferência):

      • RN de termo à 0,5-1 mcg/kg/hora (se dor moderada) ou à 1-2 mcg/kg/hora (se dor intensa);
      • RN pré-termo à 0,5 mcg/kg/hora (se dor moderada) ou à 1 mcg/kg/hora (se dor intensa).

Também com o fentanil, poderá surgir fenómeno de tolerância, sobretudo quando se utiliza infusão contínua (obrigando eventualmente à necessidade de doses crescentes para obter efeito.

Como efeito colateral poderá observar-se bradicárdia. Se o tratamento for superior a 3 dias, deverá providenciar-se redução gradual da dose para evitar síndroma de abstinência.

Como antagonista emprega-se também a naloxona: dose de 0,01 mg/kg para reversão da depressão respiratória. A naloxona está contraindicada no RN de mãe toxicodependente. Doses elevadas de morfina > 5 mcg/kg, injectadas rapidamente, poderão levar a rigidez muscular sobretudo a nível torácico, com compromisso ventilatório.

*Meperidina

Actualmente está praticamente proscrita. Apresenta um metabólito tóxico a normeperidina, e pode diminuir o limiar convulsivo principalmente em RN com insuficiência renal.

*Tramadol

Trata-se dum opióide sobre o qual ainda existem aspectos não esclarecidos quanto a farmacocinética, farmacodinâmica e segurança. Cabe apenas referir que, de acordo com estudos realizados, este fármaco evidenciou excelentes propriedades analgésicas com efeitos acessórios irrelevantes – em comparação com a morfina – no que se refere a obstipação e depressão respiratória.

Em perfusão IV tem sido utilizado para a dor moderada, na dose de 0,10-0,25 mg/kg/hora, sem relato de efeitos adversos importantes.

Medidas analgésicas farmacológicas (locais)

Considerando os vários anestésicos locais disponíveis no mercado, a mistura eutética de prilocaína (25%) e lidocaína (25%) sob penso adesivo, com a marca registada EMLA® (sigla de eutectic mixture local anesthetics) produz analgesia em pele intacta durante cerca de 60-90 minutos após a aplicação; pode ser usada em RN de termo e pré-termo com idade gestacional superior a 32 semanas e idade pós-natal superior a 7 dias.

Como resultado da sua aplicação poderão surgir eritema, vesículas e petéquias. Estudos recentes demonstraram que a aplicação de EMLA® é um método seguro desde que a área de aplicação não ultrapasse 100 cm2 e sejam evitadas aplicações repetidas (risco de metemoglobinémia, mais marcado se se associar o paracetamol).

Em circunstâncias especiais poderá utilizar-se lidocaína a 0,5%, sem adrenalina, na dose de 5 mg/kg, por via SC. O início do efeito deste último fármaco é quase imediato e a sua duração é de 30 a 60 minutos após a infiltração.

Sedativos

Os sedativos são agentes farmacológicos (não analgésicos), utilizados como complemento dos analgésicos; agem diminuindo a actividade, ansiedade e agitação do paciente, podendo levar à amnésia de eventos dolorosos ou não dolorosos.

Tais fármacos têm indicações muito restritas: realização de procedimentos diagnósticos que implicam certo grau de imobilidade do doente (por ex.TAC, RM, ECG, EEG, etc.) em situações acompanhadas de dor, tratadas com analgésicos.

Por outras palavras, a utilização continuada de sedativos deve ser desencorajada, pois comporta certos riscos como por ex.: prolongamento do período de ventilação mecânica, HIPV e LPV, entre outros.

Além disso, cabe ao clínico, antes da sua prescrição, excluir outras causas de agitação ou irritabilidade, como hipoxémia, ou a própria dor.

Os sedativos mais frequentemente utilizados com os objectivos descritos são:

Midazolam

Em bólus a dose a aplicar é 0,05-0,15 mg/kg/ dose IV, cada 2 a 4 horas.

Em perfusão contínua IV (de preferência): 10-60 mcg/kg/hora.

Como nota importante há que realçar a necessidade de reajustamento (diminuição) de dose se se utilizar em associação com morfina ou fentanil, para evitar depressão respiratória e hipotensão. É um fármaco com boa actividade sedativa hipnótica, sendo 2 a 4 vezes mais potente que o diazepam.

Hidrato de cloral

Utiliza-se em procedimentos terapêuticos ou de diagnóstico de curta duração a dose de 25-75 mg/kg, podendo ser repetida cada 6 ou 8 horas (vias oral ou rectal). Em RN pode levar a hiperbilirrubinémia (directa e indirecta) e acidose metabólica. Em RN pré-termo o efeito residual da droga pode manter-se até 64 horas após a administração.

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