Etiopatogénese e importância do problema

Cálcio e Fósforo

O cálcio (Ca), o mineral mais abundante no corpo humano, assume grande importância no recém-nascido em crescimento pelas funções de formação óssea e participação em processos metabólicos intra e extracelulares. Está igualmente envolvido na coagulação sanguínea, condução nervosa, contracção muscular e função cardíaca. Durante a gravidez o cálcio é transferido activamente da mãe para o feto através da placenta, com maior magnitude no terceiro trimestre.

O fósforo (P) é igualmente transferido para a circulação fetal através de transporte activo via placenta; no primeiro trimestre atinge concentração superior à do cálcio, decrescendo depois até ao final da gestação, precisamente no período em que se verifica o maior acréscimo de cálcio.

O recém-nascido está dependente da absorção intestinal de cálcio, do tipo de cálcio fornecido, e da forma como este se liga às gorduras ou proteínas. A relação adequada entre o suprimento de cálcio e fósforo (Ca/P) é também determinante para a sua absorção e retenção.

Magnésio

O magnésio (Mg), depois do potássio (K), é o segundo catião intracelular mais abundante: cerca de 60% do total encontra-se no tecido ósseo, 30% nos músculos, e 10% noutros tecidos. Actuando como coenzima em mais de 300 processos, a sua acção mais importante relaciona-se com o bloqueio da transmissão neuromuscular, diminuição da excitabilidade do músculo estriado e diminuição do tono da musculatura lisa. Tal como o cálcio, transferido para o feto, atinge o maior acréscimo no terceiro trimestre da gestação. Na data do nascimento os níveis sanguíneos de Mg dependem dos respectivos níveis maternos; na vida pós-natal a regulação depende da PTH. Baixa concentração de Mg incrementa a secreção de PTH, a qual contribui para mais elevada reabsorção tubular do mesmo. Pelo contrário, elevando-se a concentração sérica de Mg, é estimulada a secreção de calcitonina que diminui a reabsorção tubular do catião.

Entre o Ca e o Mg ocorre uma interacção fisiológica pois, qualquer alteração de um dos iões provoca alteração no outro. A PTH promove a elevação do teor de ambos, enquanto a calcitonina leva à diminuição. Como implicações clínicas importantes desta interacção há que salientar que a situação de hipocalcémia refractária ao tratamento poderá constituir um epifenómeno de hipomagnesiémia.

HIPOCALCÉMIA

Definição e importância do problema

A hipocalcémia é um problema comum no período neonatal, dado que o suprimento exógeno de cálcio nos primeiros dias de vida é inferior ao que corresponde à transferência materno-fetal transplacentar no último trimestre de gestação (cerca de 100-150 mg/kg de peso fetal/dia).

Nos RN de termo define-se hipocalcémia como valor sérico de cálcio ionizado (Ca2+) inferior a 4,40 mg/dL (1,10 mmol/L) e/ou de cálcio total inferior a 8,0 mg/dL (2,0 mmol/L). Dado que o Ca2+ é a única forma fisiologicamente activa do cálcio, este doseamento é o considerado preferível para estabelecer o diagnóstico.

Nos RN pré-termo, define-se hipocalcémia como valor de cálcio sérico total inferior a 7,0 mg/dL (1,75 mmol/L) e de cálcio ionizado (< 0,75-1,1 mmol/L ou < 3-4,4 mg/dL).

Salienta-se que a hipoalbuminémia pode levar à falsa sugestão de hipocalcémia porque em tal circunstância o valor sérico de Ca total está diminuído, embora o Ca ionizado (Ca2+) esteja normal. Por isso, em situações suspeitas de hipo- ou hipercalcémia, é preferível a determinação do Ca ionizado.

A hipocalcémia ocorre em cerca de 1 a 2% dos RN aparentemente saudáveis. A frequência é superior nos RN de mães diabéticas (RNMD, cerca de 50%) em relação directa com a gravidade da diabetes materna e associada habitualmente a hipomagnesiémia e a secreção diminuída de hormona paratiroideia (PTH).

Globalmente, nos RN pré-termo surge, como média, em 30% dos casos.

Ao contrário da hipoglicémia, não origina lesões estruturais no SNC.

Etiopatogénese e factores de risco

A normocalcémia depende da interacção de vários factores, nomeadamente do equilíbrio com outros iões, do equilíbrio ácido-base do organismo, e de respostas hormonais reguladas pela hormona paratiroideia (PTH), calcitonina e 1,25-(OH)2 vitamina D.

Os efeitos da PTH (não transferida através da placenta) são: elevação das concentrações séricas de Ca e Mg e diminuição das de P; tal resulta fundamentalmente da acção ao nível do osso (libertação de Ca, P, Mg com diminuição dos respectivos depósitos), rim (aumento da reabsorção de Ca e Mg, diminuição da reabsorção de P, e aumento da produção de 1,25-(OH)2 vitamina D).

Os efeitos da calcitonina (também não transferida através da placenta) são: diminuição das concentrações séricas de Ca, Mg e de P; tal resulta fundamentalmente da acção ao nível do osso (aumento de depósitos por diminuição da libertação de Ca e P), e do rim (aumento da excreção de Ca, P, e Mg).

Os efeitos do metabólito di-hidroxilado da vitamina D [1,25-(OH)2 colecalciferol], transferido através da placenta, são: elevação das concentrações séricas de Ca e P; tal resulta fundamentalmente da acção ao nível do intestino (aumento da absorção de Ca e P), osso (aumento da libertação de Ca e P), e rim (aumento da reabsorção de Ca e P).

São descritas duas formas clínicas de hipocalcémia em função da data de aparecimento:

  • Precoce (início antes das 48 e 72 horas de vida e relacionada com eventos intrauterinos ou perinatais); e
  • Tardia (iniciada em geral a partir da primeira semana de vida e relacionada com eventos iatrogénicos ou com defeitos congénitos). Estas formas clínicas integram grupos de risco diversos.

Hipocalcémia precoce

Após o parto existem factores predisponentes de hipocalcémia precoce; com efeito, após laqueação do cordão umbilical é interrompido o suprimento de cálcio proveniente da mãe e verifica-se uma sobrecarga endógena de fosfato (P) devido ao consumo das reservas de glicogénio com libertação concomitante de P para o espaço extracelular.

Diminuindo fisiologicamente os níveis de cálcio (Ca), a glândula paratiroideia é estimulada, do que resulta elevação dos níveis de PTH com o objectivo de elevação do referido cálcio sérico. Esta resposta à PTH em termos de elevação do cálcio sérico (traduzindo-se por mobilização do cálcio ósseo) faz-se em cooperação com o 1,25-di-hidroxi-colecalciferol (traduzindo-se por reabsorção tubular renal de cálcio e fosfatúria).

Ora, este mecanismo, em determinados grupos de RN de risco, é limitado:

  • RN pré-termo (RNPT);
  • RN de mãe diabética (RNMD);
  • RN com antecedentes asfixia perinatal;
  • RN de mãe epiléptica.

Nos primeiros três grupos de RN, em conjunto, o mecanismo geral descrito como resposta ao declínio do Ca sérico está retardado, verificando-se quadro de hipoparatiroidismo transitório, diminuição transitória dos níveis do metabolito di-hidroxilado da vitamina D (ou 1,25-di-hidroxi-colecalciferol) e aumento dos níveis de calcitonina (cujo significado não está completamente esclarecido).

Como mecanismos específicos, descritos respectivamente em cada grupo de risco, citam-se:

  • No RNPT, a taxa de natriurese intensifica as perdas de Ca urinário;
  • No RNMD, a menor actividade da PTH, assim como a hipomagnesiémia materna e fetal explicam a maior incidência e maior duração da hipocalcémia;
  • Na asfixia perinatal a hipoxémia e acidose, levando a catabolismo tecidual, originam libertação importante de P com consequente hiperfosfatémia e repercussão na paratiroideia (resistência relativa à PTH);
  • O tratamento materno com fármacos anticonvulsantes, como o fenobarbital e a difenil-hidantoína, pode incrementar o catabolismo hepático da vitamina D com consequente hipocalcémia na mãe e no feto.

Hipocalcémia tardia

Esta forma é tipificada pelas seguintes situações:

Hipoparatiroidismo

São descritas as seguintes formas de apresentação:

  • Hipoparatiroidismo congénito
    • ligado ao cromossoma X;
    • forma autossómica dominante, em relação com genes localizados no cromossoma 16 ou 18;
    • forma integrando a síndroma de DiGeorge (anomalias dos 3º e 4º arcos branquiais determinando, entre outras anomalias, ausência de timo e paratiroideias).
  • Hipoparatiroidismo secundário a hiperparatiroidismo materno, procedimentos cirúrgicos – tiroidectomia, paratiroidectomia –, doença autoimune, e a carência de vitamina D).
Pseudo-hipoparatiroidismo (insensibilidade periférica à PTH)

São descritas três formas (todas com hipocalcémia e hiperfosfatémia), distintas pelas variantes quanto a anomalias duma “proteína de ligação Gs-alfa” do receptor da PTH e da produção de adenilato-ciclase.

Furosemido e bicarbonato de sódio

Estes fármacos originam alcalose com consequente diminuição do cálcio ionizado; por outro lado, o furosemido origina igualmente calciúria importante.

Nutrição parentérica

Através da administração de lípidos a elevação de ácidos gordos livres pode formar complexos insolúveis com o Ca.

Défice de suprimento ou de absorção de Ca

As situações mais típicas de défice de absorção de Ca são a doença celíaca e a síndroma do intestino curto.

Excesso de suprimento de P

O excesso de fosfato (por ex. relacionado com a ingestão de fórmulas lácteas com elevado teor de P), para além de inibir a resposta da PTH, exerce efeito semelhante à calcitonina.

Alterações do equilíbrio ácido-base

A alcalose como consequência da administração de solutos alcalinizantes ou de hiperventilação (por ex. em situações de displasia broncopulmonar) pode precipitar hipocalcémia através da diminuição da concentração de Ca ionizado (tetania pós-acidótica).

 Manifestações clínicas e diagnóstico

A hipocalcémia no período neonatal pode ser assintomática, sobretudo na forma precoce.

As formas sintomáticas surgindo apenas em cerca de 0,2% dos casos [irritabilidade muscular, hipertonia em extensão descrevendo-se um quadro típico chamado espasmo carpo-pedal, (actualmente raro dado o investimento na prevenção), laringospasmo, tremores, convulsões generalizadas ou focais] podem ser desencadeadas pela coexistência doutras alterações iónicas, como hipomagnesiémia, hipercaliémia e alcalose metabólica.

Pode haver repercussão cardíaca traduzida por taquicárdia, sinais electrocardiográficos (prolongamento do intervalo Q-T no electrocardiograma, por vezes associado a arritmia).

Dado que os sinais clínicos e electrocardiográficos de hipocalcémia são inespecíficos e não patognomónicos desta situação, o diagnóstico definitivo só poderá ser feito através do doseamento sérico do cálcio, de preferência -como foi referido – da sua fracção ionizada; na mesma amostra de sangue é aconselhável proceder ao doseamento simultâneo do P e do Mg por serem frequentemente coexistentes alterações destes últimos, com manifestações semelhantes.

Outros doseamentos séricos (PTH, calcitonina, vitamina D ou seus metabólitos) devem ser reservados para situações de hipocalcémia prolongada, refractária ou recorrente.

Como nota prática, importa reter que a hipocalcémia prolongada deve orientar o clínico para a detecção de situações como hipoparatiroidismo congénito ou síndroma de DiGeorge.

Tratamento

O objectivo do tratamento da hipocalcémia é repor o nível sérico do Ca através da administração de sais de cálcio.

Nos casos de hipocalcémia assintomática precoce, recomenda-se uma atitude expectante, tendo em consideração que muitas destas situações são autolimitadas. A hipocalcémia, no entanto, mesmo assintomática, deve ser tratada sempre no RN pré-termo, e também sempre que seja verificado nível sérico de cálcio total inferior a 6,0 mg/dL.

São adoptados os seguintes procedimentos:

  1. Hipocalcémia assintomática ou sintomática na ausência de convulsões, tetania ou apneia
    Perfusão contínua de gluconato de cálcio a 10% na dose de 5-8 mL/kg/dia; na ausência de contra-indicação e de boa tolerância oral, a mesma dose poderá ser dividida em três a quatro tomas por dia (tendo em conta a seguinte correspondência: solução de gluconato de cálcio a 10% <> 9,4 mg de Ca elemento/mL ou 102 mg de gluconato de cálcio/mL);
  1. Hipocalcémia acompanhada de convulsões, tetania ou apneia
    Bólus de gluconato de cálcio a 10% à 1-2 mL/kg em 10 minutos, eventualmente a repetir mais 3-4 vezes ao longo de 24 horas caso se mantenha a sintomatologia; após bólus eficaz: perfusão IV contínua de gluconato de cálcio a 10% na dose de 5-8 mL/kg/24 horas.
    A administração deve ser interrompida após normalização da calcémia e desaparecimento dos sinais clínicos. Torna-se fundamental corrigir outros desequilíbrios associados e contabilizar eventual terapêutica hipocalcemiante em curso.
  1. Hipocalcémia tardia
    Para além de tratamentos específicos em função dos factores etiológicos, é fundamental: diminuir o suprimento de P (utilizando fórmulas lácteas com baixa concentração de P); aumentar o suprimento de Ca (suplemento); e aumentar a relação Ca/P.

Notas importantes:

    • Deve ser sempre garantida concomitantemente a administração, tanto por via oral como por via intravenosa, da dose diária de Ca recomendada em situações habituais de normalidade.
    • Uma vez que a administração de cálcio intravenoso pode originar complicações graves, sempre que possível e não exista contra-indicação, deve ser preferida a via oral.
    • São complicações possíveis da administração intravenosa de cálcio o extravasamento da solução com deposição de cálcio nos tecidos moles circundantes e necrose tecidual, ou mesmo deposição subcutânea em diversos órgãos; bradicárdia ou mesmo paragem cardíaca; litíase renal; e possivelmente também calcificações cerebrais nos RN em estado crítico.
    • O Ca não deve ser administrado: 1) por via intra-arterial (risco de lesão vascular); 2) por via IM (risco de necrose tecidual); 3) através de cateter venoso umbilical com cateter localizado intra-hepático ou perto do coração.
    • Não está recomendada a prevenção de hipocalcémia nos RN de risco, devendo estes ser vigiados clinicamente e medicados com dose basal adequada de cálcio; constitui excepção o caso do RN com peso de nascimento < 1.000 gramas.

Prognóstico

Quando diagnosticada e corrigida precocemente, a hipocalcémia tem bom prognóstico. Salienta-se contudo que a verificação de convulsões pode comportar risco imediato de vida.

HIPERCALCÉMIA

Definição e importância do problema

Define-se hipercalcémia neonatal como valor sérico de Ca total superior a 2,75 mmol/L (11mg/dL), ou de Ca ionizado superior a 1,4 mmol/L (5,6 mg/dL). De referir que a hiperproteinémia pode originar elevação da Ca total, mas não do Ca ionizado. Trata-se dum problema clínico raro no RN, em geral iatrogénico ou secundário a situações de hipofosfatémia grave (< 0,5 mmol/L ou < 2 mg/dL).

Etiopatogénese e manifestações clínicas

Os factores etiológicos da hipercalcémia podem ser sistematizados do seguinte modo:

Hiperparatiroidismo primário (forma autossómica recessiva)

Nalgumas destas formas raras de hiperparatiroidismo a produção excessiva de PTH, por insensibilidade dos receptores da paratiroideia ao Ca ionizado, pode originar hipercalcémia elevada com hipotonia, dismineralização óssea e fracturas.

Hiperparatiroidismo secundário

Esta forma pode resultar de adenoma ou de hipoparatiroidismo materno do qual resulta hiperplasia paratiroideia, sendo que as alterações bioquímicas são transitórias ao contrário do que acontece na forma primária.

Outras doenças da paratiroideia

Incluem a hipercalcémia hipocalciúrica familiar benigna (forma autossómica dominante cujas manifestações são dominadas pela obstipação e hipotonia) e a hipercalcémia infantil idiopática, provavelmente relacionada com secreção anormal de calcitonina e resposta aumentada à vitamina D.

Hipercalcémia de causa nutricional

São exemplos:

  • Hipofosfatémia;
  • Verifica-se mobilização de Ca a partir do osso, sendo que este evento, por não haver deposição óssea do mesmo, poderá levar a nefrocalcinose;
  • Intoxicação pela vitamina D (aumento da absorção intestinal de Ca);
  • Intoxicação pela vitamina A (aumento da mobilização do Ca ósseo).

Necrose gorda subcutânea

Admite-se que se trata de anomalias do metabolismo das gorduras (com libertação de Ca a partir dos tecidos) associada a sensibilidade anómala à vitamina D. Ocorre sobretudo em RN macrossomáticos sujeitos a hipotermia, asfixia perinatal e parto traumático. Precedendo a hipercalcémia surgem placas bem demarcadas ao nível das proeminências ósseas, nádegas, regiões genianas, etc..

Doenças da tiroideia

Quer o hipotiroidismo (originando provavelmente absorção aumentada do Ca), quer o hipertiroidismo (originando mobilização de Ca a partir do ossso) podem levar a hipercalcémia.

Situações iatrogénicas

As mais frequentes são: – hipertratamento da hipocalcémia; – excesso de administração de Ca no decurso de exsanguinotransfusão para prevenção da hipocalcémia; – tratamento com tiazidas que promovem excreção urinária aumentada de Ca.

Tratamento

Nas formas assintomáticas pode adoptar-se atitude expectante até valores séricos de Ca ~ 12,5 mg/dL.

As medidas terapêuticas incluem:

  • Furosemido como agente calciurético administrado na dose de 1 mg/kg/dose cada 2 a 4 horas durante 1 a 2 dias;
  • Corticóides (por ex. prednisolona na dose de 1 mg/kg/dia durante 3-4 dias);
  • Outros fármacos poderão ser utilizados: fosfatos, inibidores da sintetase das prostaglandinas, etc..

HIPOFOSFATÉMIA

DEFINIÇÃO, ETIOPATOGÉNESE; CLÍNICA E TRATAMENTO

Os valores de referência para o P sérico no RN, situam-se entre 4,8-8 mg/dL.

A hipofosfatémia, potencial causadora de hipercalcémia (ver atrás) pode surgir em RNMBP submetidos a nutrição parentérica ou em lactentes alimentados com fórmulas lácteas com baixo teor de fosfatos (défice de suprimento).

Outras causas no RN podem ser assim sistematizadas:

  • Desvios transcelulares
    • Glucose IV, administração de insulina.
  • Perda renal
      • Hiperparatiroidismo, raquitismo hipofosfatémico ligado ao X, idem autossómico dominante, diuréticos, expansão de volume em fluidoterapia, glucocorticóides, etc..
  • Multifactorial
      • Sépsis, diálise;
      • Carência de vitamina D, raquitismo vitamina D dependente (em lactentes).

Se os valores séricos forem inferiores a 0,8 mmol/L (2,5 mg/dL), será necessário perfundir uma solução endovenosa de fosfato e interromper temporariamente a nutrição parentérica.

HIPERFOSFATÉMIA

DEFINIÇÃO, ETIOPATOGÉNESE; CLÍNICA E TRATAMENTO

A causa mais frequente de hiperfosfatémia (> 8 mg/dL) é a disfunção renal.

Outras causas no RN podem ser assim sistematizadas:

  • Desvios transcelulares
    • Hemólise aguda, síndroma de lise tumoral, rabdomiólise, acidose láctica.
  • Suprimento aumentado
    • Iatrogénica [tratamento da hipofosfatémia, enemas, laxantes, intoxicação pela vitamina D (em lactentes)].
  • Excreção diminuída
    • Disfunção renal;
    • Calcinose tumoral familiar (doença rara, AR, manifestada noutras idades).
  • Reabsorção aumentada no túbulo proximal
    • Hipoparatiroidismo e pseudo-hipoparatiroidismo.

Em situações de hiperfosfatémia deve dosear-se a creatininina e a ureia no sangue pela probabilidade de estar em causa quadro de disfunção renal. Em presença de hiperfosfatémia ligeira e hipocalcémia acentuada deve proceder-se ao doseamento de PTH, o que poderá levar a distinguir hipoparatiroidismo de pseudo-hipoparatiroidismo.

O tratamento da hiperfosfatémia aguda depende da gravidade e etiologia da mesma. Nas formas ligeiras, e perante função renal mantida, existe probabilidade de resolução espontânea com restrição do suprimento de P.

HIPOMAGNESIÉMIA

Definição e etiopatogénese

Define-se hipomagnesiémia como a verificação de valor sérico de Mg inferior a 1,6 mg/dL (0,66 mmol/L). Habitualmente, as manifestações clínicas só surgem quando o valor é inferior a 1,2 mg/dL (0,49 mmol/L).

Os factores etiológicos da hipomagnesiémia podem ser sistematizados do seguinte modo:

  • Défice de suprimento de Mg
    • Síndroma de intestino curto em que se verifica défice de absorção;
    • RN de mãe diabética (RNMD) no qual são descritos os seguintes mecanismos:
      1. défice de resposta da PTH a valor sérico baixo de Mg;
      2. hipomagnesiémia fetal causada pela perda urinária materna de Mg decorrente da poliúria durante a gravidez; tal défice fetal continua na vida pós-natal.
    • RN com restrição de crescimento intrauterino (RCIU) associado a défice de transferência transplacentar materno-fetal de Mg.
  • Excesso de perda de Mg
    Tal poderá acontecer nos casos de exsanguinotransfusão com sangue citratado: o citrato forma complexos com o Mg, diminuindo a sua concentração na forma livre.
  • Alterações da homeostase do Mg
    Como exemplos citam-se o hipoparatiroidismo neonatal e a hiperfosfatémia.

Manifestações clínicas

As manifestações clínicas da hipomagnesiémia são semelhantes às da hipocalcémia: sinais de hiperexcitabilidade neuromuscular, convulsões tónicas, clónicas, focais ou generalizadas, etc.. A repercussão cardíaca pode traduzir-se em alterações do ECG: inversão da onda T e depressão do segmento ST.

  1.  

Nota importante: a hipomagnesiémia pode indiciar hipocalcémia refractária à terapêutica; com efeito, administração de Mg constitui um coadjuvante do tratamento da hipocalcémia.

Tratamento

O tratamento da hipomagnesiémia aguda tem como objectivo essencial a reposição do Mg (sulfato de magnésio) identificando e corrigindo a sua etiologia. Em geral utiliza-se o sulfato de Mg a 50% na dose de 0,1-0,2 mL/kg por via IM ou IV lenta durante 1 hora.

O sal com esta concentração contém 49.3 mg de Mg – elemento por mL ou 500 mg de sulfato de Mg por mL. A administração de sulfato de Mg IV ou IM – que pode ser repetida cada 12 ou 24 horas – obriga à monitorização cardíaca do RN, pelo risco de arritmias e alterações da condução auriculoventricular.

Havendo tolerância oral, uma vez calculada a dose diária de Mg, pode utilizar-se PO de 8-8 ou de 12-12 horas na condição de se utilizar concentração do sulfato de Mg a 5 ou 10%; tal implica diluição prévia do sulfato de Mg a 50%.

O tratamento obriga a determinação sérica diária do Mg e vigilância clínica no sentido de evitar a hipermagnesiémia.  

Quando diagnosticada e tratada adequadamente, a recuperação da hipomagnesiémia é completa.

Nota: A administração de cálcio ou vitamina D em situação de hipomagnesiémia não tratada, pode agravar o défice de Mg.

HIPERMAGNESIÉMIA

Definição e etiopatogénese

Define-se hipermagnesiémia como a verificação de valor sérico de Mg superior a 3 mg/dL. No RN a causa mais frequente desta alteração é a administração de Mg à mãe em relação com eclâmpsia materna ou parto pré-termo; a coexistência de asfixia perinatal e de prematuridade constituem factores agravantes, na medida em que existe défice de excreção urinária de Mg em tais situações.

Manifestações clínicas

As principais manifestações clínicas (em geral surgindo somente a partir de valores de Mg > 6 mg/dL) incluem depressão respiratória e neuromuscular; a duração de tais sinais depende mais da duração do tratamento com Mg instituído à mãe grávida do que do nível de hipermagnesiémia.

Tratamento

Deve adoptar-se atitude expectante a qual inclui, para além da interrupção de medicações contendo Mg, eventual suporte respiratório em função do contexto clínico.

Pode utilizar-se furosemido (1 mg/kg/dose cada 2 ou 4 horas) associado a fluidoterapia IV no sentido de promover a excreção urinária de Mg.

Nos casos de toxicidade neuromuscular está indicada a administração de gluconato de cálcio a 10% (0,1-0,3 mL/kg/dose) IV lento. Em casos extremos e refractários poderão estar indicadas a exsanguinotransfusão ou a diálise.

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