Definição e importância do problema

Mesmo que as estratégias ventilatória e antimicrobiana praticadas numa unidade de cuidados intensivos neonatais sejam de excelência, a qualidade assistencial praticada nestas pode considerar-se deficitária se não for dada a devida atenção ao suporte nutricional.

Os recém-nascidos total ou parcialmente impossibilitados de utilizar a via entérica, requerem nutrição parentérica (NP), método em que os nutrientes são administrados por via intravenosa.

Apesar de haver, desde há muito, programas informatizados que auxiliam a prescrição de NP neonatal, as premissas em que assentam os critérios não são muitas vezes consensuais e estão em contínua mudança.

Este capítulo baseia-se nas actuais Recomendações da Sociedade Portuguesa de Neonatologia de 2019, publicadas em Port J Pediatr 2019;50:209-219 (parte I) e Port J Pediatr 2019;50:220-231 (parte II), por sua vez orientadas por recomendações conjuntas de quatro sociedades científicas, publicadas em 2018: European Society of Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition (ESPGHAN), European Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ESPEN), European Society of Pediatric Research (ESPR) e Chinese Society of Parenteral and Enteral Nutrition (CSPEN). No final do mesmo é incluído um Anexo para consulta rápida de doses de nutrientes recomendadas por nutrição parentérica em recém-nascidos pré-termo.

GENERALIDADES

Normas de orientação e recomendações

As recomendações nacionais sobre NP neonatal revistas em 2008 (Acta Pediatr Port. 2008; 39: 125-34), reflectiram-se em assinalável adesão dos neonatologistas e melhoria da prática clínica. Um inquérito sobre as práticas de prescrição, respondido por 72% dos coordenadores de unidades neonatais portuguesas, revelou que 83% das unidades seguiam tais recomendações, 87% iniciavam aminoácidos no primeiro dia pós-natal e 95% iniciavam lípidos nos primeiros três dias pós-natais. Talvez por não haver recomendação nacional similar sobre a preparação de NP neonatal, foram detectados pontos débeis (por ex. controlo de qualidade) noutro inquérito nacional contemporâneo feito aos responsáveis pela sua preparação.

Particularmente para recém-nascidos muito e extremo pré-termo, são revistos aspectos fundamentais relacionados com os critérios de prescrição dos macro e micronutrientes, quer usando a prescrição individualizada com preparação em farmácia hospitalar, quer bolsas comerciais de composição fixa prontas a usar.

Indicações

A NP está indicada sempre que não é possível estabelecer uma nutrição entérica suficiente por período prolongado, nomeadamente nas seguintes situações:

  • Prematuridade, sobretudo < 33 semanas de gestação;
  • Anomalias congénitas principais do aparelho gastrintestinal ou que se reflictam no seu funcionamento, por ex., atrésia do esófago, atrésia intestinal, gastrosquise e hérnia diafragmática;
  • Doenças que atinjam gravemente o tubo digestivo, por ex., enterocolite necrosante e síndroma do intestino curto;
  • Restrição de crescimento intrauterino especialmente associado a prematuridade e a alterações nos achados Doppler;
  • Asfixia perinatal grave;
  • Cardiopatia congénita com compromisso da perfusão visceral e no pós-operatório precoce de cirurgia cardíaca.

Contraindicações e limitações

A NP não deve ser utilizada se houver: desidratação aguda, acidose metabólica mantida, desequilíbrios hidroeletrolíticos e metabólicos persistentes (acidose metabólica e alterações da natrémia, caliémia, glicémia e calcémia), insuficiências renal ou hepática agudas.

Em grande parte das situações associadas a estresse (por ex., cirurgia, sépsis), não está preconizado interromper a NP, mas sim proceder a ajustes individuais.

Formulação das misturas

Geralmente, são usadas misturas binárias de NP, isto é, duas misturas separadas, respectivamente:

  • Uma solução hidroeletrolítica contendo glicose, aminoácidos, eletrólitos e oligoelementos e, outra;
  • Uma emulsão de lípidos e vitaminas.

Por motivos económicos e de conveniência, há autores que propõem que as misturas preparadas em farmácia hospitalar sejam incluídas numa só bolsa (designada por mistura ternária ou “três-em-um”); contudo, tal estratégia está condicionada por alterações na estabilidade e compatibilidade físico-química de vários componentes.

Notas importantes:

    • As noções básicas, que integram este capítulo relacionam-se na sua generalidade com os tópicos anteriormente abordados noutros capítulos sobre balanço hidro-eletrolítico.
    • Todas as doses descritas neste capítulo, de preparados, compostos ou elementos diversos, referem-se a RN de termo ou pré-termo no contexto de nutrição parentérica.

Preparação individualizada e bolsas de composição fixa

Actualmente, na maioria das unidades neonatais portuguesas é usada a prescrição de NP individualizada e preparação em farmácia hospitalar (compounding). A prescrição é geralmente feita com auxílio de suporte informático, procedimento que comprovadamente melhora a eficiência da prescrição, reduz erros de prescrição e poupa muitos cálculos aos prescritores e preparadores. Tal preparação individualizada deve ser centralizada em farmácia hospitalar e preferida em recém-nascidos muito pré-termo com risco acrescido de desequilíbrios metabólicos, como hipo- e hiperglicémia, hipo- e hipernatrémia e hipo- e hipercaliémia.

Recentemente, passaram a ser comercializadas bolsas de NP neonatal de composição fixa, com as vantagens de estarem prontas a usar, serem de fácil armazenamento e terem garantida a estabilidade dos nutrientes.

Estimativa da osmolalidade

A osmolalidade é expressa em mOsm/Kg de água (solvente) e a osmolaridade em mOsm/L de solução (soluto + solvente).

Sendo a osmolalidade obtida por medição e a osmolaridade por cálculo, foi validada por osmometria uma equação simples para estimativa da osmolalidade de soluções de NP neonatal, baseada nas concentrações dos quatro componentes mais influentes: glicose, aminoácidos, fósforo e sódio; as concentrações de glicose e aminoácidos são expressas em g/L, a de fósforo em mg/L e a de sódio em mEq/L: Osmolaridade (mOsm/L) = (aminoácidos x 8) + (glicose x 7) + (sódio x 2) + (fósforo x 0,2) – 50; equação equivalente foi disponibilizada com as concentrações molares de azoto, glicose, sódio e fósforo. A referida equação, que pode ser incorporada em folha de cálculo e em programas informáticos, tem sido sugerida por vários autores, verificando-se boa correlação com as equações propostas pela American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ASPEN).

Vias de administração

Na NP binária, a solução aquosa com glicose e aminoácidos é geralmente perfundida utilizando linha individual, à qual se liga a perfusão lipídica por conexão em Y, o mais próximo do local de venopunção ou da inserção de cateter. A opção de administrar NP por via periférica ou por via central depende de vários factores, como a duração prevista da NP, a osmolalidade da solução e a facilidade de acesso de uma via central.

Via periférica

Está indicada quando é prevista NP por período inferior a 2 semanas, existem bons acessos periféricos e bom estado nutricional. São limitações as venopunções frequentes e o suprimento insuficiente de energia e nutrientes, dado que soluções com teor adequado de nutrientes facilmente excedem 900 mOsm/Kg.

Via central

Está indicada quando é prevista NP por período prolongado, utilizando osmolalidade dos componentes em mOsm/Kg: > 900, ou concentração de glicose > 12,5 g/dL na solução final. Mesmo por via central, a osmolalidade não deve ser > 1.700 mOsm/Kg, ou a concentração de glicose não ser > 15 g/dL.

Tipos de cateter mais usados:

  • venoso central, de inserção percutânea periférica (epicutâneo-cava); ou venoso de inserção percutânea central (por ex., na veia subclávia, tipo Arrow®) – se previsão de NP inferior a 2-3 semanas;
  • venoso central, com túnel (eg, tipo Broviac®) – se previsão de NP superior a 2-3 semanas.

Utilizando os vasos umbilicais:

  • veia umbilical, se via periférica não disponível, especialmente em recém-nascidos < 1.000 g e utilização por menos de 5 dias;
  • artéria umbilical, apenas se não houver outra alternativa e se a utilização for inferior a 48 horas.

Heparinização de cateteres

Existe controvérsia sobre a vantagem do uso de heparina para evitar a oclusão de cateteres centrais destinados à administração de NP neonatal. Actualmente, os peritos no âmbito da ESPGHAN/ESPEN/ESPR/CSPEN não recomendam o seu uso profiláctico por rotina. No entanto, de acordo com uma revisão sistemática concluiu-se que havia vantagem da adição de heparina à solução hidroelectrolítica, na dose de 10-15 UI/kg/d.

Um procedimento preventivo alternativo ao uso de heparina por rotina, para promover a permeabilidade de cateteres aplicados intermitentemente, é a sua lavagem (flushing) semanal, com pequenos volumes de soro fisiológico heparinizado (5-10 UI/ml).

De salientar que a heparina não deve ser adicionada às emulsões lipídicas por poder alterar a sua estabilidade.

Armazenamento e filtros

Os dois principais factores que determinam a estabilidade de soluções de NP durante o armazenamento são a temperatura e a exposição à luz.

Segundo um estudo sobre a estabilidade físico-química de soluções binárias de NP neonatal comprovou-se que estas se mantêm estáveis por 4 meses à temperatura de 4-8 ºC.

Todas as soluções de NP devem ser protegidas da luz natural e artificial (incluindo fototerapia), durante o armazenamento e a administração, para reduzir a probabilidade de degradação de algumas vitaminas e a formação de peróxidos de hidrogénio e lipídicos.

Durante a administração é recomendado o uso de filtros de 1,2 micras na administração de misturas ternárias e de 0,22 micras para misturas binárias, a fim de reter micropartículas ou precipitados.

Complicações

As complicações mais frequentemente associadas à NP neonatal incluem: sépsis relacionada com cateter central, oclusão trombótica do cateter central, assim como extravasamento, fractura do cateter central e migração deste.

A doença metabólica óssea e a colestase associada à NP são consequência de pausa alimentar prolongada com dependência de NP exclusiva.

Vigilância clínica e laboratorial

Antropometria: peso (diariamente), comprimento e perímetro cefálico (semanalmente).

Avaliação laboratorial:

  • Na primeira semana pós-natal, diariamente – glicemia, densidade urinária, glicosúria, gasometria no sangue, ionograma sérico e calcémia; e duas a três vezes por semana – hemograma, urémia (BUN) e creatininémia.
  • Após a primeira semana, para além das análises referidas, devem ser avaliadas semanalmente as transaminases, fosfatase alcalina, bilirrubinas total e conjugada, γ-glutamil transpeptidase, albuminémia e trigliceridémia.

Para evitar a espoliação excessiva em recém-nascidos muito pré-termo estáveis, a periodicidade do controlo analítico pode ser menos frequente.

PRESCRIÇÃO INDIVIDUALIZADA

Líquidos

QUADRO 1 – Suprimento diário de líquidos (mL/kg), desde a primeira semana pós-natal.

Dia pós-natalD1D2D3D4D5≥ D6
Termo40-6050-7060-8060-100100-140140-170
Pré-termo ≥ 1.500 g60-8080-100100-120120-140140-160140-160
Pré-termo < 1.500 g80-100100-120120 -140140-160160-180140-160


Considerações:

  • Nos primeiros dias pós-natais, os principais determinantes do balanço hídrico no recém-nascido muito pré-termo são a oligúria relativa e a perda transepidérmica de água. Para não exceder o suprimento hídrico recomendado, é necessário contrariar a perda transepidérmica providenciando humidade ambiente de 80-90% e ambiente de termoneutralidade, preferencialmente em incubadora de dupla parede.
  • A humidade deve ser diminuída rapidamente a partir dos 5 dias pós-natais, para evitar o risco de infecção. Uma estratégia complementar é utilizar cobertor de plástico. A seguir à fase de oligúria relativa, segue-se outra de diurese e natriurese, sendo desejável que o recém-nascido muito e extremo pré-termo perca 7-10% do peso de nascimento.
  • Embora seja controverso, poderá ser necessário aumentar o suprimento de líquidos (não mais do que 10% das necessidades basais) se for usada incubadora aberta ou fototerapia.
  • Parâmetros orientadores da prescrição:
    • Densidade urinária – é desejável que se situe entre 1005-1010;
    • Natrémia – na primeira semana pós-natal reflecte essencialmente o estado de hidratação (a hiponatrémia indica hiperidratação, e a hipernatrémia desidratação);
    • Diurese – é desejável que se situe entre 1-3 mL/kg/h, considerando oligúria o valor < 0,5-1 mL/kg/h e poliúria > 6-7 mL/kg/h;
    • Evolução ponderal – nos primeiros dias pós-natais, reflete o estado de hidratação.

Energia

QUADRO 2 – Suprimento diário (kcal/kg) de energia recomendado.

D <> Dia vida

Dias pós-nataisD 1D 2-6≥ D 7
Termo4060-8090-100
Pré-termo45-5560-8090-120

Considerações:

  • O suprimento energético excessivo aumenta o risco de acumulação exagerada de massa gorda; o suprimento insuficiente predispõe à restrição de crescimento, compromisso do neurodesenvolvimento e alteração da imunidade.
  • Idealmente, a glicose deve contribuir com 45-55% da energia total, os lípidos com 30-40% e os aminoácidos com 10-15%; os lípidos não devem exceder 40-60% da energia não-proteica.
  • Um grama (1 g) de glicose fornece 4 kcal; um grama (1 g) de aminoácidos fornece igualmente 4 kcal; e um grama (1 g) de lípidos fornece 9 kcal.

Glicose

QUADRO 3 – Suprimento diário (mg/kg/min) de glicose recomendado

    • Início: termo 2,5-5 mg/kg/min; pré-termo 4-8 mg/kg/min
    • Posteriormente, deve-se aumentar gradualmente 1-2 mg/kg/min, ajustando a dose para manter glicemia entre 45-120 mg/dL
    • Dose mínima: termo 2,5 mg/kg/min (3,6 g/kg/d) e pré-termo 4 mg/kg/min (5,8 g/kg/d)
    • Dose máxima 12 mg/kg/min (17,3 g/kg/d) no termo e pré-termo


Considerações:

  • A dose máxima recomendada de glicose é de 12 mg/kg/min (17,3 g/Kg/d). Um suprimento exagerado de glicose pode promover a lipogénese e excessivo armazenamento de gordura, aumento da susceptibilidade a infecções e retinopatia da prematuridade.
  • Situações como estresse, infecção e medicação com metilxantinas podem predispor a hiperglicemia. Na fase aguda de doença (por ex, sépsis), o suprimento de glicose não deve exceder 5-7 mg/kg/min no primeiro dia de doença.
  • Em caso de hiperglicemia (>145 mg/ dL), a dose de glicose deve ser diminuída; poderá também ser necessário diminuir a de lípidos pelo seu efeito hiperglicemiante mediado pela neoglicogénese.
  • O uso de insulina deve ser apenas considerado se a hiperglicemia persistir apesar de de o suprimento de glicose ser reduzido para 4 mg/kg/min, e/ou se a glicemia se mantiver >180 mg/dL.

Parâmetros orientadores da prescrição:

  • Glicemia venosa ou capilar: hiperglicemia se >145 mg/dL e hipoglicemia se <40 mg/dL.
  • Pesquisa de glicosúria (fitas reagentes).

Aminoácidos

QUADRO 4 – Suprimento diário (g/kg) de aminoácidos recomendado.

Dias pós-nataisD 1≥ D 2Máximo
Termo> 1,52,5-3,03,0
Pré-termo> 1,52,5-3,53,5


Considerações:

  • A administração parentérica de aminoácidos é considerada menos fisiológica que a entérica, por ser feita directamente para a circulação sistémica, sem passar pelo metabolismo hepático e esplâncnico.
  • O suprimento de energia não-proteica > 65 kcal/kg/d promove a retenção azotada; contudo, se tal suprimento for inferior não se deve limitar a dose de aminoácidos, uma vez que a quantidade que não é utilizada para a retenção azotada é oxidada para produção de energia.
  • Em recém-nascidos pré-termo, o início precoce de aminoácidos, estimulando a secreção endógena de insulina, poderá contribuir para prevenir a hiperglicé

Parâmetros orientadores da prescrição:

  • Urémia e azoto ureico (BUN): valores de referência 5,5-22 mg/dL. O valor da urémia equivale a 2,14 do valor de BUN (por ex., 20 mg/dL de urémia equivalem a 9,3 mg/dL de BUN). O azoto ureico constitui um bom indicador do suprimento proteico, exceptuando nos primeiros dias pós-natais, muito influenciados pelo estado de hidratação e função renal. Um valor baixo de BUN indica suprimento insuficiente; todavia, um valor no limiar superior poderá apenas reflectir uma eficiente oxidação dos aminoácidos e não sua intolerância.

Lípidos

QUADRO 5 – Suprimento diário (g/kg) de lípidos recomendado.

    • Início com 1-2 g/kg desde o primeiro dia pós-natal
    • Aumento diário de 0,5-1 g/kg até ao máximo de 4 g/kg
    • Administrar por perfusão contínua durante as 24 h

 

Considerações:

  • As emulsões lipídicas são uma boa fonte de energia, de ácidos gordos essenciais e de substracto para acréscimo de gordura em recém-nascidos muito pré-termo com escassa reserva adiposa fetal.
  • É necessária a dose mínima de 1 g/kg/d para evitar o défice de ácidos gordos essenciais que ocorre ao fim de 72 h sem suprimento exógeno, usando as actuais emulsões lipídicas. Idealmente, a emulsão lipídica deve conter ácidos gordos n-6 e n-3 (óleo de peixe), substâncias com boa capacidade antioxidante (por ex., α–tocoferol e ácidos gordos monoinsaturados) e, porventura, ácidos gordos de cadeia média (menos dependentes da carnitina).
  • Embora os recém-nascidos pré-termo sejam deficitários em carnitina (que facilita o transporte dos ácidos gordos para o interior da mitocôndria onde são oxidados), com a sua suplementação não foram verificadas vantagens.
  • Uma vez que as emulsões lipídicas são iso-osmolares, podem ser administradas por via periférica.
  • Especialmente em recém-nascidos pré-termo, todo o sistema de perfusão (seringa, tubos) da emulsão lipídica deve estar protegido da luz, em especial da fototerapia, para evitar a formação de peróxidos de lípidos e de hidrogénio e consequente lesão celular.
  • Receios não comprovados do uso parentérico de lípidos, não se aconselhando a limitação da sua administração: 1) Não está comprovado que predisponha à doença pulmonar crónica ou à retinopatia da prematuridade; 2) Na trombocitopénia, admite-se que outros cofactores são responsáveis pelos efeitos adversos atribuídos aos lípidos, como o défice de vitamina E (responsável pela redução do número de plaquetas) e a administração de heparina (interferindo com a função plaquetar); 3) Estudos in vitro e in vivo não demonstraram claramente que os lípidos endovenosos interferem negativamente no sistema imune, nomeadamente na actividade dos monócitos; e 4) A utilização de lípidos endovenosos pode predispor à sépsis por Staphylococcus coagulase negativo e Candida; contudo, as vantagens nutricionais da sua utilização são francamente superiores aos riscos.
  • Na hiperbilirrubinémia não conjugada, na fase aguda de sépsis, na hipertensão pulmonar e na trombocitopénia grave e não explicada, poderá ser necessário reduzir a dose dos lípidos, porventura para 1 g/Kg/d para evitar o défice de ácidos gordos essenciais.

Parâmetro orientador da prescrição:

  • Trigliceridémia: não deve exceder 265 mg/dL.

Sódio

QUADRO 6 – Suprimento diário de sódio (mEq/kg) recomendado.

Pode vir a necessitar: a 3 mEq/kg/d; b 7 mEq/kg/d
Dias pós-nataisD 1-3D 4 e 5D ≥6
Termo0-21-32-3
Pré-termo ≥ 1.500 g0-2 a2-53-5
Pré-termo < 1.500 g0-2 a,b2-5 b3-5 b

Considerações:

  • Sódio (Na): 1 mmol = 1 mEq = 23 mg.
  • Em recém-nascidos pré-termo, nos primeiros dias pós-natais deve permitir-se o balanço negativo fisiológico de sódio, sob pena de predispor à morbilidade, nomeadamente persistência do canal arterial e displasia broncopulmonar. Embora alguns autores tenham descrito que a administração de sódio por NP desde o primeiro dia pós-natal não se associa a hipernatrémia, a maioria das sociedades científicas recomenda que se protele a sua administração ou não se exceda 2 mEq/Kg/d até que ocorra perda de > 6% do peso ao nascer, que indica o estabelecimento de natriurese suficiente. Tal interpretação pode ser enviesada se a diminuição de peso resultar da perda transepidérmica de água (e não da natriurese), por não ter sido providenciada a adequada de humidade ambiente.
  • Durante a primeira semana pós-natal, a natrémia reflecte o estado de hidratação; posteriormente, indica também a reserva de sódio. A hipernatrémia nos primeiros dias pós-natais pode resultar de desidratação por exagerada perda transepidérmica de água ou de inadequado suprimento de sódio. A hiponatrémia pode resultar de hemodiluição por oligúria, perda renal no caso de recém-nascidos muito pré-termo, ou do uso de diuréticos e cafeína.
  • Se as necessidades de sódio forem superiores às recomendadas, o suprimento basal deve ser fornecido por NP e o suplementar por perfusão independente em Y de solução com sódio, usando por exemplo NaCl 20% (1 ml = 3,4 mEq); este método permite ajustar de forma conveniente a dose em função da natrémia.

Parâmetro orientador da prescrição:

  • Natrémia: valores de referência 135-145 mEq/L.
  • Sódio urinário: uma amostra de urina com Na < 20 mEq/L associada a hiponatrémia ou uma excreção fraccionada de sódio (FENa) < 3% em recém-nascidos de termo ou < 4% em recém-nascidos pré-termo, indica depleção da volémia.

Cloro

QUADRO 7 – Suprimento diário de cloro (mEq/Kg) recomendado.

Dias pós-nataisD 1-3D 4-5D ≥ 6
Termo e Pré-termo0-32-52-5


Considerações:

  • Cloro (Cl): 1 mmol = 1 mEq = 35,5 mg.
  • O suprimento de cloro geralmente acompanha o de sódio e a dose não deve exceder a de sódio e de potássio para evitar a acidose metabólica hiperclorémica.
  • Em recém-nascidos muito e extremos pré-termo, o suprimento excessivo de cloro associa-se à acidose metabólica hiperclorémica (> 114 mEq/L). Isto pode ser prevenido ou resolvido substituindo parcialmente o cloro por acetato.

Parâmetros orientadores da prescrição:

  • Cloremia: valores de referência 96-106 mEq/L.
  • Gases no sangue: para vigilância de acidose.

Potássio

QUADRO 8 – Suprimento diário de potássio (mEq/Kg) recomendado.

Iniciar ≥ D2 se diurese ≥ 1 ml/kg/h
Necessidades de acordo com a maturidade e peso  

    • Termo: 1-3 mEq/kg
    • Pré-termo ≥ 1.500 g: 1-3 mEq/kg
    • Pré-termo < 1.500 g: 1-2 mEq/kg


Considerações:

  • Potássio (K): 1 mmol = 1 mEq = 39 mg.
  • Embora alguns autores refiram que a administração de potássio por rotina desde o primeiro dia pós-natal não se associa hipercaliémia, as sociedades científicas recomendam que seja iniciada a sua administração apenas quando se verificar diurese ≥ 1 ml/kg/h, na ausência de hipercaliémia.
  • Em recém-nascidos ventilados, as alterações súbitas da caliémia podem resultar de variações do equilíbrio ácido-base: a acidose metabólica com acidémia associa-se à hipercaliémia e a alcalose metabólica à hipocaliémia.
  • A hipercaliémia em particular pode ocorrer associada ou não a oligúria. A hipercaliémia não-oligúrica pode ocorrer na presença de hematoma, hemólise e falta de administração de corticóides pré-natais em recém-nascidos muito pré-termo. Nestes, a hipocaliémia pode resultar de suprimento insuficiente face à elevada demanda, perda renal ou uso de diuréticos e cafeína.
  • Se as necessidades de potássio forem superiores às recomendadas, o suprimento basal deve ser fornecido por NP e o suplementar por perfusão independente em Y de solução com potássio, usando por exemplo KCl 7,5% (1ml = 1 mEq); este método permite ajustar de forma conveniente a dose em função da caliémia.

Parâmetros orientadores da prescrição:

  • Caliémia: valores de referência 3,5-4,5 mEq/L.
  • Diurese.

Cálcio e Fósforo

Quadro 9 – Suprimento diário (mg/Kg) de cálcio e fósforo recomendado.

 TermoPré-termo
1ª semana pós-natal
Pré-termo
> 1ª semana pós-natal
Cálcio   
mg/kg30 – 6032 – 80100 – 140
mmol/kg0,8 – 1,50,8 – 2,02,5 – 3,5
Fósforo   
mg/kg20 – 4031 – 6277 – 108
mmol/kg0,7 – 1,31,0 – 2,02,5 – 3,5
Ratio Ca:P   
mg:mg1,3 – 1,71,31,3 – 1,7
molar1,0 – 1,31,01,0 – 1,3

 

Considerações:

  • Cálcio (Ca): 1 mmol = 2 mEq = 40 mg; Fósforo (P): 1 mmol = 31 mg; a valência do fósforo varia conforme esteja na forma de fosfato monobásico ou dibásico.
  • Utilizando a ratio Ca:P de mg:mg 1,7:1 (molar 1,3:1) antes recomendada em recém-nascidos muito pré-termo, era frequente ocorrer hipercalcémia, hipofosforémia e hipocaliémia em presença de doses recomendadas de aminoácidos (> 2,5 g/kg/d). Isto era devido ao crescimento celular induzido pelo adequado suprimento de aminoácidos, o que originava a mobilização intracelular de potássio e fósforo, consequente hipocaliémia e hipofosforémia, com mobilização óssea de cálcio em resposta à hipofosforé Mulla et al (2017) demonstraram que, em recém-nascidos muito pré-termo, a utilização da ratio Ca:P mg:mg de 1,3:1 (ou equimolar de 1:1), à custa do aumento da dose de fósforo, obvia o problema.
  • Na actual recomendação da ESPGHAN/ESPEN/ESPR/CSPEM são propostas doses muito elevadas de cálcio e fósforo em recém-nascidos pré-termo (Quadro 9), o que levanta preocupações quanto à sua compatibilidade, estabilidade e risco de precipitação. Para que a segurança esteja garantida, será necessário testar tais doses associadas a diferentes tipos e concentrações de soluções de aminoácidos, diferentes sais de fosfato e diferentes pH das soluções finais, o que parece não ter sido ainda totalmente analisado. São factores determinantes da boa compatibilidade de cálcio e fósforo nas soluções de NP a utilização de sais orgânicos de cálcio e fósforo e pH < 7,1 na solução final, que promove a formação de fosfato de cálcio dibásico (60 vezes mais compatível que o monobásico). Não estando provada cientificamente a garantia de compatibilidade e estabilidade mineral usando as tais doses elevadas (Quadro 9), será preferível adoptar, pelo menos de início, os valores descritos por Mulla et al (2017): cálcio 88-90 mg/kg/d, fósforo 68-70 mg/kg/d e ratio Ca:P molar de 1 (ou de 1,3:1 em mg).
  • Ao optar-se por administrar fósforo nos primeiros dias pós-natais, importa contabilizar a quantidade apreciável de sódio contida na maioria dos sais de fósforo, por ex. 2 mEq de sódio por 1 ml de glicerofosfato de sódio.
  • Soluções com elevada concentração de cálcio devem ser administradas por cateter central, pelo risco de necrose tecidual quando há extravasamento ao ser usada a via periférica.

Parâmetros orientadores da prescrição:

  • Fosforémia e fosfatase alcalina: não há marcadores bioquímicos precoces confiáveis de doença metabólica óssea da prematuridade. No entanto, de entre os marcadores bioquímicos mais usados, a hipofosforémia (< 5,5 mg/dL ou < 1,8 mmol/L) e a elevação da fosfatase alcalina (> 900 UI/L), particularmente a combinação de ambos, são os marcadores com maior sensibilidade e especificidade, sendo a calcémia um mau marcador.

Magnésio

QUADRO 10 – Suprimento diário de magnésio recomendado.

 TermoPré-termo
1ª semana pós-natal
Pré-termo
> 1ª semana pós-natal
Magnésio   
mg/kg2,4 – 5,02,0 – 5,05,0 – 7,5
mmol/kg0,1 – 0,20,1 – 0,20,2 – 0,3
mEq/kg0,2 – 0,40,2 – 0,40,4 – 0,6


Considerações:

  • Magnésio (Mg): 1 mmol = 2 mEq = 24 mg.
  • A suplementação parentérica de magnésio só deve ser iniciada se a magnesiémia estiver dentro dos limites normais, especialmente em recém-nascidos pré-termo nos primeiros dias pós-natais, quer pela baixa taxa de filtração glomerular e limitada capacidade da sua excreção renal, quer por possível exposição pré-natal a sulfato de magnésio usado como tocolítico.

Parâmetro orientador da prescrição:

  • Magnesiémia – valores de referência para recém-nascidos de termo e pré-termo 0,7-1,5 mEq/L.

Vitaminas hidrossolúveis

QUADRO 11 – Suprimento diário de vitaminas hidrossolúveis recomendado para recém-nascidos de termo e pré-termo.

VitaminaDose/kg
Vitamina C (ácido ascórbico), mg15 – 25
Tiamina (vitamina B1), mg0,35 – 0,5
Riboflavina (vitamina B2), mg0,15 – 0,2
Piridoxina (vitamina B6), mg0,15 – 0,2
Niacina (nicotinamida ou vitamina B3), mg4,0 – 6,8
Vitamina B12 (cobalamina), μg0,3
Ácido pantoténico (vitamina B5), mg2,5
Biotina (vitamina B7), μg5,0 – 8,0
Ácido fólico, μg56


Considerações:

  • Embora a dose parentérica ideal da maioria das vitaminas hidrossolúveis não tenha sido determinada em recém-nascidos, o Quadro 11 indica as doses recomendadas.
  • As vitaminas hidrossolúveis devem ser administradas diariamente e adicionadas à emulsão lipídica para aumentar a sua estabilidade.
  • Sugerido o produto Soluvit N® (Fresenius Kabi) na dose diária de 1 ml/kg, contendo cada 1 ml: vitamina C 10,0 mg, tiamina 0,25 mg, riboflavina 0,36 mg, niacina 4,0 mg, piridoxina 0,40 mg, vitamina B12 0,5 μg, ácido pantoténico 1,50 mg, biotina 6,0 μg e ácido fólico 40 μ

Vitaminas lipossolúveis

QUADRO 12 – Suprimento diário de vitaminas lipossolúveis recomendado em recém-nascidos de termo e pré-termo.

a máximo 11 mg/dia; b as soluções multivitamínicas actuais fornecem dose superior
VitaminaTermoPré-termo
Vitamina A (retinol)
UI150-300/kg ou 697/dia227-455 ou 700-1.500/kg/dia
μg2.300/dia227-455/kg
Vitamina D (calciferol)
UI40-150/kg ou 400/dia80-400/kg ou 200-1.000/dia
Vitamina E (a-tocoferol)
UI2,8-3,5/kg/dia2,8-3,5/kg/dia
mg2,8-3,5/kg/dia a2,8-3,5/kg/dia a
Vitamina K, (fitomenadiona)
μg10/kg/dia b10/kg/dia b

Considerações:

  • Vitamina A 1 μg = 3,33 UI; Vitamina D 1 μg = 40 UI; Vitamina E 1 mg = 1 UI.
  • As vitaminas lipossolúveis devem ser administradas diariamente e adicionadas à emulsão lipídica para aumentar a sua estabilidade.
  • A dose de vitamina K1 fornecida pela solução de vitaminas lipossolúveis pressupõe que esta tenha sido administrada no primeiro dia pós-natal para prevenção da doença hemorrágica do recém-nascido.
  • Sugerido o produto: Vitalipid N Infantil® (Fresenius Kabi): se peso < 2,5 kg, a dose diária é de 4 ml/kg; se peso ≥ 2,5 kg, a dose diária máxima é de 10 ml. Cada 1 ml de Vitalipid N Infantil® (Fresenius Kabi), contém: vitamina A 69 μg (230 UI), vitamina D2 1 μg (40 UI), vitamina E 0,64 mg (0,70 UI) e vitamina K1 20 μ

Oligoelementos

QUADRO 13 – Suprimento diário (μg/kg) de oligoelementos recomendado.

Oligoelemento Termo Pré-termo
Zinco 250 400 – 450
Cobre 20 40
Selénio 2 – 3 7
Crómio 0 0
Manganês 1 1
Molibdénio 0,25 1
Iodo 1 – 10 1
Ferro 50 – 100 200


Considerações:

  • A transferência mãe-feto quantitativamente mais elevada dos oligoelementos ocorre no terceiro trimestre. Embora a dose parentérica da maioria dos oligoelementos não tenha sido determinada em recém-nascidos pré-termo, o Quadro 13 indica as doses recomendadas.
  • O zinco deve ser administrado desde o início da NP exclusiva. As soluções correntes de oligoelementos incluem manganês e molibdénio, cuja suplementação parentérica só está recomendada se a NP for superior a duas semanas. As soluções de NP estão geralmente contaminadas com alumínio e crómio, o que perfaz as necessidades, não sendo necessária a sua suplementação parentérica.
  • Para evitar a toxicidade, na colestase e na insuficiência hepática, as doses de cobre e manganês devem ser reduzidas. Na insuficiência renal aguda, deve ser reduzida a dose de selénio.
  • Sugerido suplementar com gluconato de zinco 0,1% (1 ml = 1000 µg de zinco) desde o início da NP. A partir das 2 semanas de NP, pode usar-se a solução completa de oligoelementos, por ex., Peditrace® (Fresenius Kabi) 1 ml/kg, contendo cada 1 ml (μg): Zn 250, cobre 20, manganês 1, selénio 2, iodo 1 e flúor 57. Em recém-nascidos pré-termo, torna-se necessário adicionar gluconato de zinco 0,1% para perfazer a dose recomendada de zinco.

 BOLSAS COMERCIAIS PRONTAS A USAR 

Como alternativa à prescrição individualizada de NP com preparação em farmácia hospitalar (em condições de assepsia, aquando da mistura dos componentes, sob câmara de fluxo laminar), passaram a estar disponíveis bolsas comerciais de NP neonatal de composição fixa e prontas a usar. Entre as suas potenciais vantagens, incluem-se: – melhoria da estabilidade físico-química das soluções, – maior garantia quanto à mistura e suprimento de macro e micronutrientes, – melhor custo-efectividade, – redução dos erros de prescrição e da contaminação bacteriana, – e disponibilidade dum produto durante 24 horas, em qualquer dia da semana, sem a dependência dos serviços farmacêuticos.

Por estes motivos, as ESPGHAN/ESPEN/ESPR/CSPEM recomendam a utilização destas bolsas, preferindo-as relativamente à prescrição e preparação individualizada em farmácia hospitalar, inclusive para recém-nascidos pré-termo, desde que estes estejam em condições de estabilidade, e as referidas bolsas sejam usadas por períodos inferiores a 2-3 semanas, com a devida monitorização laboratorial.

Contudo, tal modalidade não deve ser usada em recém-nascidos muito e extremo pré-termo com risco de desequilíbrio metabólico, como hipo- e hiperglicémia, hipo- e hipernatrémia e hipo- e hipercaliémia, tendo em consideração, em tal contexto, a necessidade de serem ajustados, para correcção, os suprimentos de macro e micronutrientes até à estabilização metabólica.

Em Portugal, encontram-se comercializadas as bolsas de NP neonatal prontas a usar Numeta® (Baxter), tendo as Pediaven NN® (Fresenius Kabi) a autorização de introdução no mercado, cedida pelo INFARMED.

Bolsas Numeta® (Baxter)
Segundo o fabricante, a Numeta G13%E® (Baxter), está indicada em recém-nascidos pré-termo e a Numeta G16%E® (Baxter) nos de termo.

Trata-se de bolsas tricompartimentadas, contendo respectivamente solução de glicose, solução de aminoácidos com eletrólitos e emulsão de lípidos. No momento da administração, activa-se a remoção do selo entre os compartimentos de glicose e de aminoácidos/eletrólitos e, ao pretender administrar-se também lípidos, activa-se a remoção do selo do respectivo compartimento.

As soluções Numeta® (Baxter) não contêm vitaminas nem oligoelementos, os quais devem ser adicionados quando se decide a sua administração.

SITUAÇÕES PARTICULARES

Sépsis

Na fase aguda da sépsis pode ocorrer hiperglicémia por aumento da resistência à insulina e hipertrigliceridémia por elevação das catecolaminas e cortisol e diminuição da actividade da lipoproteína lípase.

Ao complicar-se com trombocitopénia, não há comprovação de que os lípidos endovenosos diminuam o número ou função das plaquetas; admite-se que tais factos sejam devidos respectivamente a défice de vitamina E e à perfusão de heparina.

Na fase aguda da sépsis, não está demonstrado que haja maior necessidade de aminoácidos, anotando-se que o excesso de nutrientes na fase catabólica pode ser contraproducente.

Actuação prática

  1. A glicose deve ser a fonte energética preferencial; se ocorrer hiperglicémia (> 145 mg/dL), o suprimento de glicose deve ser reduzido, se necessário até 2,5 mg/kg/min no recém-nascido de termo e 4 mg/kg/min no pré-termo.
  2. Se ocorrer hipertrigliceridémia (> 265 mg/dL), o suprimento de lípidos deve ser reduzido, se necessário para 1 g/kg/d para evitar o défice de ácidos gordos essenciais.
  3. Na fase aguda da sépsis deve ser garantido o suprimento de, pelo menos, 60 kcal/kg/d e 2,5 g/kg/d de aminoácidos.

Colestase

No recém-nascido, a colestase associada à NP é multifactorial, sendo factores independentes a duração da NP e a dose elevada de glicose, e não a dose de lípidos ou de aminoácidos.

Quanto aos componentes das emulsões lipídicas, admite-se que o elevado teor em fitoesteróis e ácidos gordos n-6 e o baixo teor em a-tocoferol predispõem à colestase associada à NP, enquanto o elevado teor em óleo de peixe tem efeito de protecção.

Por outro lado, deve ter-se em conta a potencial toxicidade do cobre e manganês na colestase, pela dificuldade da sua excreção pela bílis.

Como forma de prevenir ou mitigar a colestase associada à NP (bilirrubina conjugada > 2 mg/dl), descreve-se a seguir a:

Actuação prática

  1. Reduzir a dose de glicose, porventura para níveis que não excedam a sua capacidade oxidativa (8,3 mg/kg/min).
  2. Aumentar a nutrição entérica e reduzir/suspender a NP logo que possível.
  3. Preferir emulsões lipídicas que contenham óleo de peixe e a-tocoferol.
  4. Conforme a gravidade da colestase, suspender ou reduzir a solução de oligoelementos por conterem cobre e manganês.

Hiperbilirrubinémia não conjugada

Em recém-nascidos pré-termo, há controvérsia sobre a possibilidade de os ácidos gordos livres resultantes da hidrólise dos triglicéridos deslocarem a bilirrubina ligada à albumina, elevando a fracção livre de bilirrubina para níveis neurotóxicos. Tal parece não ocorrer se a ratio molar ácidos gordos livres:albuminénia for < 6; ou seja, será menos provável se os níveis de albuminénia estiverem dentro dos limites de referência.

A actuação prática consiste em recém-nascidos pré-termo, reduzir a dose de lípidos se bilirrubinémia não-conjugada for > 10 mg/dL

Hipertensão pulmonar

Em recém-nascidos de termo e pré-termo, a perfusão endovenosa de lípidos pode agravar a hipertensão pulmonar, com efeito dependente da dose e do tempo.

A actuação prática consiste, dependendo da gravidade da hipertensão pulmonar, em suspender temporariamente os lípidos, ou diminuir o respectivo suprimento até 1 g/kg/d.

Grande cirurgia

Nos recém-nascidos submetidos a grande cirurgia, devidamente anestesiados e analgesiados, há necessidade de ligeiro acréscimo do suprimento energético (cerca de 15%) no pós-operatório imediato (cerca de 4 h após a cirurgia). Durante este período, também está comprovado que o turnover proteico não aumenta significativamente.

Como actuação prática refere-se que no pós-operatório, inclusive imediato, não há necessidade de aumentar o suprimento energético-proteico se a analgesia for adequada.

ANEXO: Consulta rápida – Doses diárias em recém-nascidos pré-termo.

 1º dia pós-natalIncremento diárioMáximo
* Enquanto não houver estudos suficientes que garantam a compatibilidade e estabilidade mineral usando doses superiores.
Líquidos (ml/kg/d)60 – 100
humidade 80-90%
10 – 15160 – 180
Energia (kcal/kg/d)45 – 5590 – 120
Glicose (mg/kg/min)4 – 8q.b. para glicémia
45-120 mg/dL
12
 Aminoácidos (g/kg/d)> 1,50,5 – 13,5
 Lípidos (g/kg/d)1 – 20,5 – 14
 Na (mEq/ kg/d)0 – 2
após perda > 6% peso nascimento
3 – 5
(até 7)
 Cl (mEq/kg/d)Idêntica ao NaIdêntica ao Na
 K (mEq/kg/d)1 – 3
após diurese > 1 mL/Kg/h
1 – 3
 Ca (mg/kg/d)32 – 80100 – 140
(*ou 88 – 90 mg/kg/d, máximo 68 mg/dL)
 P (mg/kg/d)Dividir dose Ca por 1,3Dividir dose Ca por 1,3Dividir dose Ca por 1,3
 Mg (mEq/kg/d)0,2 – 0,40,4 – 0,6
Vitaminas hidrossolúveis (ml/kg/d)
(Soluvit N Infantil ®)
11
Vitaminas lipossolúveis (ml/kg/d)
(Vitalipid N Infantil®)
1 – 214
 Oligoelementos
< 2 semanas NP
≥ 2 semanas NP


Zn 400 – 450 µg/kg/d




Zn 400 – 450 µg/kg/d
Peditrace® 1 ml/kg/d + Zn (para perfazer 400-450 µg/kg/d)

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